Cabana 28: o horror e a negligência no crime da cidade de Keddie

11/03/2021 às 12:004 min de leitura

Quando Glenna Susan Sharp, mais conhecida como Sue, decidiu se mudar com seus filhos para o velho Resort Keddie era para ser um recomeço. Nascida em 29 de março de 1945, em Massachusetts, nos Estados Unidos, outono de 1980, foi quando Sue foi embora de Connecticut para poder fugir de James Sharp, seu ex-marido com quem tivera um casamento turbulento e abusivo. Com seus cinco filhos — John (15), Sheila (14), Tina (12), Rick (10) e Greg (5) —,  ela seguiu ao norte da Califórnia, na cidade de Quincy, para ficar perto de seu irmão, Don Davis.

A princípio, a família ficou em um antigo e apertado trailer que Don havia desocupado recentemente em um camping de trailers muito lotado, porém o lugar era pequeno demais para tantas pessoas. Depois de algum tempo lá, Sue descobriu que tinha um antigo resort no meio da floresta da região censitária de Keddie, na Califórnia, já em decadência há muitos anos e por isso havia transformado suas cabanas em moradias baratas. Para Sue, esse era o local perfeito.

O recomeço

Sue Sharp. (Fonte: Pinterest/Reprodução)Sue Sharp. (Fonte: Pinterest/Reprodução)

A família escolheu a dilapidada cabana 28, que era a mais espaçosa e conseguia abrigar todos confortavelmente. Ela tinha 3 quartos, sendo que John decidiu ocupar o velho porão, enquanto os mais novos, Rick e Greg, dividiram um quarto, assim como Sue, Tina e Sheila fizeram, deixando o outro aposento apenas para a mãe.

O Resort Keddie se mostrou perfeito para o recomeço, pois, apesar de estar situado em meio a floresta, o local tinha diversas outras famílias e crianças com quem os Sharp pudessem fazer amizades e brincar. Eles estavam acostumados a se mudar com frequência, visto que James Sharp era um ex-oficial da Marinha, então a situação não era um problema.

A descoberta de Sheila

(Fonte: Pinterest/Reprodução)(Fonte: Pinterest/Reprodução)

Em 11 de abril de 1981, Sue estava em casa apenas com Ricky e Greg, que andavam de bicicleta com seu amigo Justin Eason pelas imediações. John estava com a sua melhor amiga, Dana Wingate, na cidade vizinha, enquanto Sheila e Tina estavam brincando com os vizinhos Seabolt em uma cabana próxima.

Quando a noite caiu, Eason decidiu ficar na cabana 28 para uma festa do pijama, assim como Sheila resolveu permanecer na casa dos Seabolt depois que sua irmã Tina foi embora para casa. Não se sabe exatamente qual foi o horário que John e Dana voltaram, mas já era muito tarde da noite, pois quando Sue colocou Justin e Ricky na cama já passava das 22h.

Testemunhas relataram algumas coisas estranhas, como um cachorro latindo perto da cabana 28, a luz da varanda acesa às 4h e uma agitação incomum dos gatos, que entravam e saíam incessantemente. Talvez eles já pressentissem algo de errado.

(Fonte: Wix/Reprodução)(Fonte: Wix/Reprodução)

Às 8h, Sheila Sharp voltou para casa decidida a apenas trocar de roupas e ir para junto dos Seabolt para o serviço de domingo na igreja. Contudo, assim que entrou em casa, ela se deparou com uma cena perturbadora: quatro cadáveres na sala de estar.

Primeiro, ela reconheceu seu irmão John, que estava caído de bruços em uma poça do próprio sangue de sua garganta cortada. Sue estava deitada de lado perto do sofá, nua da cintura para baixo e amordaçada com uma bandana azul e sua própria calcinha. Ela foi esfaqueada no peito, teve a garganta dilacerada e a cabeça espancada com coronhadas. Dana Wingate estava coberta por ferimentos na cabeça, mas foi morta por estrangulamento.

Sheila saiu correndo e gritando da cabana, pedindo para que os Seabolt ligassem para a polícia. Quando voltou para casa com James Seabolt Jr., ela acordou Rick, Greg e Justin Smartt espancando a janela de um dos quartos e pedindo para que eles saíssem por ali. Apesar de assustados, os três estavam ilesos.

A pergunta era: onde estava Tina Sharp?

Sangue no carpete

(Fonte: True Crime Magazine/Reprodução)(Fonte: True Crime Magazine/Reprodução)

Além da porta dos fundos da cabana aberta, o Gabinete do Xerife do Condado de Plumas, que assumiu o caso, encontrou duas facas de cozinha ensanguentadas, sendo que uma delas estava com a lâmina dobrada, certamente pela severidade com a qual foi utilizada. No local, também foi identificado um martelo e uma espingarda de chumbo. As vítimas foram amarradas com fita e cabos de força arrancados dos eletrodomésticos. A jaqueta, os sapatos de Tina e uma caixa de ferramentas estavam faltando na casa.

Apenas um casal foi acordado por volta de 1h30 por causa de um grito abafado, mas fora isso ninguém na vizinhança ouviu mais nada. O mais estranho de tudo, porém, é que as três crianças não foram acordadas com o crime acontecendo na casa, apesar de Justin Eason ter alegado que sonhou com sons vindo da sala e visto dois homens. Ele chegou a fazer um retrato falado deles, mas a descrição do que acreditava ter visto mudou muito com o tempo.

(Fonte: Medium/Reprodução)(Fonte: Medium/Reprodução)

Marilyn Smartt (mãe de Justin) disse que encontrou uma jaqueta ensanguentada em seu porão, pertencente à Tina Sharp, e que a entregou à polícia, porém não havia registros disso na investigação. Martin Smartt, seu esposo, deu várias pistas desconexas para os investigadores, por isso eles pararam de ouvir sua esposa e ele. Entre as pessoas que alegaram ver algo, foi sugerido que as vítimas foram mortas por um serial killer ou por traficantes de drogas.

Entre policiais e investigadores, mais de 4 mil pessoas foram envolvidas no caso que foi descrito como “frustrante”, pois nada se emendava. Só 3 anos e 11 dias após o crime, em 22 de abril de 1984, os restos mortais de Tina Sharp foram encontrados por um coletor de garrafa a mais de 160 quilômetros de Keddie, junto de uma jaqueta azul ensanguentada, um par de jeans, um cobertor e um dispensador de fita adesiva.

Nada disso foi documentado no caso. Não foi notado que os jeans provavelmente pertenciam à Sue e que a jaqueta poderia ser a mesma que Marilyn Smartt disse encontrar. Não houve ninguém para revisar os depoimentos dos moradores, inclusive aqueles que diziam que Martin Smartt detestava John Sharp por algum motivo.

Martin Smartt. (Fonte: Find a Grave/Reprodução)Martin Smartt. (Fonte: Find a Grave/Reprodução)

Smartt era um ex-veterano de guerra que ainda sofria com Transtorno Pós-traumático, sendo notório por comportamentos violentos com a sua esposa. Algumas semanas antes do sábado de 11 de abril, ele havia conhecido John Boubede, um ex-militar que tinha conexão com o crime organizado da região. Isso também foi desconsiderado da narrativa. De acordo com o xerife Doug Thomas, Smartt e seus possíveis cúmplices foram livres de qualquer suspeita porque passaram no teste do polígrafo. Smartt morreu de câncer em junho de 2000, enquanto Boubede foi encontrado morto ainda em 1988.

Em 2016, o The Sacramento Bee publicou uma matéria onde mostrava a carta que Martin Smartt havia escrito para sua esposa logo após os assassinatos na cabana 28, quando ele teria dirigido para o estado de Nevada: “Paguei o preço do seu amor e agora o comprei com a vida de quatro pessoas”.

A carta foi “esquecida” na investigação e nunca admitida como prova, assim como Marilyn Smartt, uma mulher que sofria violência doméstica e que possivelmente foi silenciada pelos abusos, nunca foi levada em consideração, nem mesmo quando veio a público em 2008 afirmando que Smartt havia matado os Sharp.

O "mistério" dos assassinatos de Keddie nunca teve a ver com quem cometeu o crime, mas como a força-tarefa de uma operação de 4 mil oficiais foi incapaz de determinar o óbvio assassino.

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