Ciência
20/05/2023 às 07:00•2 min de leitura
Além de guerras, epidemias mortais foram responsáveis por dizimar a humanidade ao longo de sua história que antecede a medicina moderna – ou melhor, qualquer tipo de medicina. Desde 541 d.C., indo do Império Bizantino até a Grã-Bretanha do século XIX, a Peste Bubônica está no hall das que mais destruiu ao longo de seu curso, adquirindo várias alcunhas, como Praga de Justiniano e Peste Negra.
A capital Constantinopla, atual Istambul, perdeu 25% de sua população para a doença que apodrecia os órgãos de suas vítimas em pouco mais de 48 horas. Entre 1347 e 1351, mais de 25 milhões de pessoas pereceram na Europa, que só teve trégua após a última onda, quando 10% de sua população foi varrida da face da Terra.
Mas a falta da ciência também resultou em casos como a doença do Fogo de Santo Antônio, que já devastou a humanidade.
(Fonte: The Yorck Project/Wikimedia Commons)
Também conhecida como Fogo de Santo Antônio (SAF), ou, mais na modernidade, como ergotismo. A doença é causada pela ingestão de grãos de cereais, como centeio, infectados pelo fungo roxo Claviceps purpúrea, responsável por uma sensação de queimação nos membros que pode levar à gangrena, convulsões e morte.
A condição acontece quando o fungo libera substâncias alcaloides nos grãos que contamina, estimulando os receptores dos hormônios serotonina, dopamina e epinefrina que, quando consumidos, fazem com que os vasos sanguíneos se contraiam. Isso reduz o fluxo sanguíneo para os órgãos e membros, causando a morte dos tecidos.
Na modernidade, isso não significa óbito, mas em um tempo em que não havia nenhum tipo de tratamento, nem mesmo amputações minimamente adequadas, a infecção pelo tecido morto preso ao vivo era um atestado de morte certa.
(Fonte: Wikimedia Commons)
As primeiras referências históricas à doença datam de 857 d.C., mas demorou até o século XVII para que sua causa fosse formalmente identificada. No final do século XIX, as práticas agrícolas – implementadas para prevenir a infecção fúngica e remover os grãos infectados – eliminaram quase totalmente a doença em humanos, mas a humanidade pereceu antes disso.
Santo Antônio era o protetor dos enfermos, por isso os monges beneditinos que se dedicaram ao tratamento das vítimas atribuíram seu nome à doença, bem como a palavra "fogo" em referência à sensação de queimação que as pessoas sentiam nas extremidades do corpo.
(Fonte: The Yorck Project/Wikimedia Commons)
Infelizmente, a falta de registros históricos impede a ciência médica em determinar o número de pessoas que podem ter morrido de SAF ao longo dos séculos. Há apenas um surto na região de Aquitânia, que causou a morte de 20 a 40 mil pessoas por todo o país ao longo de 40 anos.
Na Idade Média, a vida miserável e os sintomas da SAF foram considerados um "resultado do pecado", como a Igreja Católica definiu. O colapso das instituições do Império Romano no Ocidente permitiu que a entidade eclesiástica dominasse todos os aspectos da sociedade, inclusive a prática da medicina.
Com isso, surgiram uma combinação de atitudes e abordagens equivocadas para tentar apaziguar o sofrimento, visto que a dor era considerada "necessária" para os "pecadores".