Artes/cultura
02/04/2020 às 10:00•3 min de leitura
Nos Estados Unidos, uma mulher de 58 anos que testou positivo para covid-19 desenvolveu uma doença cerebral rara conhecida como encefalopatia necrosante aguda, uma condição que pode ser desencadeada por infecções virais como influenza e herpes.
A paciente trabalhava em uma companhia aérea deu entrada no Hospital Henry Ford Health System, em Detroit, com febre, tosse (dois sintomas conhecidos do coronavírus) e estado mental alterado por três dias. Durante a avaliação clínica, parecia confusa, letárgica e desorientada. Seus testes deram negativo para influenza, herpes, vírus Varicella zoster e vírus do Nilo Ocidental; e o líquido cefalorraquidiano, que satura o cérebro e a medula espinhal, não continha vestígios de infecção bacteriana.
Ao observarem estes sintomas, os médicos também a testaram para o coronavírus usando um teste de diagnóstico fornecido pelos Centros dos EUA para Controle e Prevenção de Doenças (CDC), e o resultado foi positivo.
De acordo com um relatório de caso publicado no dia 31 de março pela Radiology, o dano cerebral “ainda não foi demonstrado como resultado da infecção por covid-19”. No entanto, à medida que o vírus continua a se espalhar, “clínicos e radiologistas devem estar atentos a essa apresentação entre os pacientes que apresentam covid-19 e estado mental alterado”, escreveram os autores.
Elissa Fory, neurologista do Henry Ford que fazia parte da equipe de médicos envolvidos no diagnóstico, afirmou em um comunicado que “É preciso pensar em como vamos incorporar pacientes com doença neurológica grave em nosso paradigma de tratamento. Essa complicação é tão devastadora quanto uma doença pulmonar grave”.
Tomografia computadorizada da paciente. (Fonte: Radiological Society of North America/Reprodução)
Segundo os autores do estudo de caso, a tomografia computadorizada do cérebro da paciente revelou danos simétricos no tecido do tálamo, uma estrutura no centro do cérebro que ajuda a transmitir informações sensoriais do corpo para o resto do órgão. Essas áreas danificadas pareciam mais escuras no exame de imagem da mulher do que em um cérebro saudável, o que significa que eram menos densas do que o habitual. A diminuição da densidade em regiões cerebrais podem ocorrer devido a edemas (um excesso de fluido após uma lesão), ou necrose ( quando as células que compõem o tecido morrem em grandes quantidades).
Os médicos também realizaram uma ressonância magnética para encontrar evidências de que a paciente havia sofrido uma hemorragia ou sangramento de um vaso sanguíneo rompido. Os resultados novamente apontaram danos no tálamo, assim como em partes do córtex cerebral e em outras áreas do cérebro. O diagnóstico foi de encefalopatia necrosante aguda, que sem tratamento, pode causar coma, problemas hepáticos e déficits neurológicos.
Ressonância magnética (Fonte: Radiological Society of North America/Reprodução)
“A equipe suspeitava de encefalopatia desde o início, mas só depois da tomografia computadorizada e da ressonância magnética que fecharam o diagnóstico”, disse Fory.
De acordo com o Centro de Informações sobre Doenças Genéticas e Raras dos Institutos Nacionais de Saúde (GARD) esta condição é rara, e se desenvolve mais comumente após uma infecção viral, como as causadas pela influenza A, influenza B e herpes-vírus humano tipo 6.
Essas doenças podem desencadear uma espécie tempestade de citocinas no cérebro, quando substâncias inflamatórias que normalmente ajudam o corpo a combater doenças ficam descontroladas e danificam o tecido infectado. Quando estas moléculas ficam flora de controle, podem quebrar o tecido que envolve os vasos sanguíneos cerebrais, conhecido como barreira hematoencefálica, e causar hemorragias.
Embora os médicos não possam provar diretamente que o coronavírus desencadeou a doença cerebral incomum da mulher, um relatório recente da revista The Lancet sugere que um subconjunto de pacientes infectados parece ser vulnerável ao excesso de citocinas no cérebro. Além disso, um relatório de caso publicado no Cureus Journal of Medical Science descreveu um paciente de 74 anos com covid-19 e sinais de encefalopatia.
(Fonte: Pixabay/Reprodução)
Os autores do artigo do Cureus ressaltam que “pacientes idosos com condições crônicas correm um risco aumentado de estado mental alterado no cenário de infecções agudas”. Para eles, os potenciais sintomas neurológicos da covid-19 ainda não são bem compreendidos, mas devem ser examinados em pacientes infectados. E também acreditam que a alteração no estado mental pode até servir como sintoma precoce de infecção por coronavírus em algumas pessoas.
“Se pacientes com condições neurológicas não forem considerados portadores da covid-19, isso pode representar um problema de âmbito nacional para os membros da equipe de saúde que tratam essas pessoas e, por sua vez, para o público em geral no caso de uma alta”, afirmam os autores da publicação do Cureus.