Estilo de vida
11/07/2024 às 00:00•2 min de leituraAtualizado em 11/07/2024 às 11:00
Na Caverna Cloggs, no sudeste da Austrália, uma descoberta fascinante revelou práticas de feitiçaria que remontam a 12 mil anos. Dois gravetos, encontrados em lareiras minúsculas dentro da caverna, mostraram sinais de processamento ritualístico, como queima leve e cobertura com gordura humana ou animal.
Datados por carbono, esses artefatos são os mais antigos de madeira já encontrados na Austrália e apontam para uma prática cultural contínua e transmitida por 500 gerações do povo.
A caverna está localizada nas terras do povo GunaiKurnai, uma nação aborígene que vive na parte sudeste da Austrália. Na década de 1970, arqueólogos realizaram uma escavação no local sem consultar os GunaiKurnai, os verdadeiros donos da área. Por isso, as descobertas foram limitadas, dado que os pesquisadores não conheciam bem a região e não tinham informações suficientes sobre a cultura e a história dos GunaiKurnai.
Já em 2009, esse panorama mudou, pois uma colaboração entre os GunaiKurnai e alguns antropólogos da Universidade Monash trouxe à tona uma investigação mais detalhada e que rendeu achados muito mais relevantes.
Cloggs, parcialmente colapsada há cerca de 6 mil anos, continha objetos de idades diversas. Focando em áreas não afetadas pelo colapso, os pesquisadores encontraram um bastão de Casuarina de 40 centímetros, levemente queimado, datado em aproximadamente 12 mil anos, algo que indicava que sua utilização tinha função cerimonial.
O segundo bastão, semelhante ao primeiro, tinha cerca de 11 mil anos, porém com uma extremidade pontuda, característica que indica que esse item era uma ferramenta de poder.
A preservação desses artefatos deve-se a várias condições favoráveis na caverna: sedimentos finos, ambiente seco, e solo neutro a levemente alcalino. Essas condições permitiram que os bastões e outros materiais, como folhas, se mantivessem intactos por milhares de anos.
O que torna esses achados extraordinários é a conexão direta com práticas culturais descritas no século XIX pelo etnógrafo Alfred Howitt. Ele documentou rituais dos curandeiros GunaiKurnai, conhecidos como mulla-mullung, que usavam bastões de Casuarina para lançar feitiços.
O ritual envolvia amarrar algo pertencente à vítima ou pessoa doente no bastão, untá-lo com gordura e colocá-lo em uma fogueira enquanto o mulla-mullung cantava o nome da pessoa. Quando o bastão caía, o feitiço estava completo. Esses detalhes coincidem perfeitamente com as características dos gravetos encontrados na caverna, sugerindo uma prática inalterada por milênios.
Em uma era em que muitos antropólogos viam os grupos originários australianos de forma depreciativa, Howitt destacou-se por seu genuíno interesse e respeito pela cultura aborígene, documentando práticas que teriam sido esquecidas após a colonização e confinamento dos povos indígenas em missões.
Os pesquisadores ressaltaram a relevância dessas descobertas para a cultura GunaiKurnai. Segundo eles, os artefatos estavam conservados naquele local como um meio de transmitir conhecimentos para todos que quisessem aprender mais sobre esse povo.