Artes/cultura
08/11/2024 às 15:00•3 min de leituraAtualizado em 08/11/2024 às 15:00
A bordo de uma cápsula da SpaceX que se acoplou à Estação Espacial Internacional (ISS) no início de novembro, uma carga especial veio com mais de 3 mil kg de suprimentos: o primeiro satélite do mundo feito de madeira. O LignoSat, fabricado com hinoki — uma madeira japonesa conhecida por sua leveza e resistência — deve ser lançado em órbita ainda este ano para testar a viabilidade da madeira em condições extremas, como as encontradas no espaço.
Essa missão inovadora nasceu em 2017, quando o ex-astronauta da NASA Takao Doi e sua equipe na Universidade de Kyoto se questionaram sobre alternativas sustentáveis para missões espaciais. Se a madeira pudesse ser tão durável no espaço quanto é na Terra, ela poderia substituir materiais metálicos, que são mais caros, pesados e poluentes. Ao longo de oito meses de testes na própria ISS, a madeira hinoki mostrou-se resistente a radiação, temperaturas extremas e ao desgaste, características essenciais para enfrentar os desafios do espaço.
Para construir o LignoSat, os engenheiros de Doi contaram com o apoio de mestres no “sashimono”, uma técnica japonesa tradicional de marcenaria que não utiliza pregos ou parafusos, apenas encaixes precisos. Esse método, originalmente aplicado em móveis e estruturas duradouras, garantiu que a madeira estivesse preparada para os desafios do espaço. O resultado foi um satélite que une inovação tecnológica e tradição japonesa. “Por que não criar um satélite de madeira?” brincou o professor Koji Murata, especialista em biomateriais e colega de Doi no projeto.
Agora, na órbita terrestre, o LignoSat será monitorado pelos engenheiros para observar sua resistência às mudanças de temperatura — que podem variar de -100 °C a 100 °C a cada 45 minutos. Além disso, sensores no satélite vão capturar dados sobre os campos magnéticos da Terra, um teste de resistência da estrutura de madeira. Caso o projeto seja um sucesso, essa inovação poderá inspirar outros satélites de madeira, mais sustentáveis e com menor impacto ambiental.
A madeira hinoki, aliás, é leve, resistente a rachaduras e possui histórico de uso em bainhas de espadas samurais, o que reforça seu papel de material resistente e de alta durabilidade. Assim, o LignoSat torna-se um marco de como técnicas milenares podem impulsionar o futuro da ciência espacial.
O acúmulo de detritos na órbita baixa da Terra é um problema crescente, ameaçando futuras missões espaciais e até a segurança de satélites em funcionamento. O fenômeno conhecido como Síndrome de Kessler, que pode resultar em uma reação em cadeia de colisões entre detritos espaciais, destaca a urgência em tornar a exploração espacial mais sustentável. E aí entra o LignoSat como um exemplo inspirador.
Com seu lançamento, a esperança é que o LignoSat comprove a eficácia da madeira como alternativa para satélites. A vantagem é que, ao completar sua missão, o satélite de madeira se desintegrará sem liberar resíduos nocivos, como o alumínio, na reentrada atmosférica. Esse aspecto faz do LignoSat um pioneiro, projetando o futuro em que satélites sustentáveis sejam a norma.
Como aposta o próprio Takao Doi, se a missão do LignoSat for bem-sucedida, ela poderá abrir caminho para que missões futuras de empresas espaciais, como a SpaceX, adotem esses materiais. A madeira, símbolo de tradição e sustentabilidade, pode muito bem ser a chave para um futuro de tecnologias espaciais ecológicas.