Ciência
15/09/2023 às 02:00•3 min de leitura
Em 1948, dois irmãos do interior da Califórnia, Maurice e Richard McDonald, tiveram a ideia de criar uma rede de fast food diferente de tudo o que existia. Assim, o McDonald’s, então chamado McDonald’s Brothers, começou com apenas um restaurante de beira de estrada na cidade de San Bernardino, mas com um sistema de produção e atendimento revolucionários.
O empreendimento dos irmãos permaneceu no anonimato, influente apenas entre a comunidade, que fazia filas imensas para sentar em família e degustar o saboroso hambúrguer, até que o empresário Ray Kroc o encontrou. O homem não só foi o responsável por fazer do pequeno restaurante se tornar a maior cadeia de fast food do mundo, como também por roubar a ideia dos irmãos – mas essa é uma história para outro dia.
(Fonte: McDonald’s/Reprodução)
Atualmente, a rede possui cerca de 38 mil restaurantes espalhados em 118 países pelo mundo, e vale US$ 196 bilhões. De acordo com um levantamento da Macrotrends, em setembro de 2022 o lucro bruto da empresa foi de US$ 13 bilhões, um aumento de 29% em relação a 2020.
Em 2003, a empresa lançou o slogan que sintetiza muito o seu sucesso estrelar: “Amo muito tudo isso”, e faz sentido, afinal, mais de 69 milhões de pessoas são atendidas diariamente em restaurantes da franquia. Essa, no entanto, não é a realidade de um dos países da América do Sul. Descubra o motivo pelo qual não existe McDonald’s na Bolívia.
(Fonte: Getty Images)
Um estudo do Fundo Monetário Internacional indicou que, em 1997, pesquisas domiciliares sobre renda familiar na Bolívia, principalmente em áreas urbanas, mostraram que cerca de 51% da população urbana era pobre e 21% vivia em condições de extrema pobreza. Em escala nacional, a pesquisa estimou que 63% da população era pobre, sendo que 38% vivia em condições de pobreza extrema.
A década de 1990 permitiu crescimento econômico e a implementação de políticas sociais que causaram uma redução moderada nos indicadores de pobreza. Entre 1989 e 1997, ficou claro que a porcentagem de domicílios urbanos pobres foi reduzida em aproximadamente seis pontos percentuais.
Evo Morales. (Fonte: Javier Mamani/Getty Images)
Em 1997, quando o empresário boliviano Gonzalo Sánchez de Lozada abriu uma filial do McDonald’s no país, já havia uma visão bem estruturada da sociedade e do governo em relação a como as empresas globais são as maiores instigadoras no aumento dos níveis de pobreza nacionais em muitos países.
“O fast food do Ocidente está causando muitos danos à humanidade”, disse Evo Morales, ex-presidente boliviano, conhecido por sua posição de governo pós-neoliberal. Não é para menos que Morales baniu a Coca-Cola do país em 2012, pois enxergava a ligação entre a globalização corporativa e a pobreza que assolava a Bolívia. Suas ações fizeram dele um dos políticos de maior popularidade no período que antecedeu a sua presidência.
(Fonte: Getty Images)
A princípio, o McDonald’s na Bolívia foi considerado um sucesso, com pessoas fazendo filas por horas nos drive-thrus e restaurantes. Isso deixou os empresários seguros o suficiente para investirem cada vez mais em novas unidades da marca pelas cidades do país. E como costuma fazer na maioria dos países, a rede adicionou ao cardápio oficial um pouco da culinária local para ter maior adesão e apelo ao paladar das pessoas. Nesse caso, foi um molho picante servido quente, chamado "Llhua", muito usado pelos bolivianos nas refeições cotidianas.
Mas a verdade é que a divisão da marca na América do Sul mirava apenas em pessoas que já conheciam a rede em viagens ao exterior ou pelas publicidades na televisão e internet. Esse nicho de pessoas, que envolvia muitos turistas, estava disposta a esperar na fila para consumir os produtos McDonald's e gastar uma quantia significativa de dinheiro nisso. Mas esse não era o caso dos nativos.
Os bolivianos rejeitaram os preços do McDonald's, altos demais em comparação a outros pratos típicos com mais sabor e qualidade. Naquela época, era possível conseguir uma refeição completa com algum tipo de carboidrato, proteína e bebida a U$ 2, enquanto um combo da rede de fast food não era menos que U$ 5.
(Fonte: Getty Images)
Em 2002, o ex-vice-presidente da divisão da América do Sul do McDonald’s, J.C. Gonzales-Mendez, considerou que era melhor retirar a franquia do país, após cinco anos consecutivos de perda de capital.
Não só a economia como também a cultura da Bolívia não estavam prontas para incorporarem o McDonald’s em seu mercado. A marca não estudou bem o país onde queria se estabelecer e acabou esquecendo que a culinária local é uma expressão muito forte dos bolivianos.
Hoje, a Bolívia já se rendeu ao consumismo que o McDonald’s inspira, reunindo diversas outras franquias pelo país. Todas essas, porém, aprenderam com os erros cometidos pelo McDonald's e incorporaram fatores culturais em seus produtos, estabelecendo uma margem de oferta que não se sobressai ao que a cultura nacional dispõe.