Ciência
15/08/2024 às 16:00•3 min de leituraAtualizado em 09/09/2024 às 08:42
O narcisismo ainda é um fenômeno muito incompreendido e um verdadeiro quebra-cabeças para a ciência. No imaginário popular, o rótulo de narcisista é amplamente utilizado para se referir a uma pessoa muito ensimesmada, como Donald Trump, notoriamente obcecado por atenção e admiração, ou até mesmo Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, que já chegou a usar um terno risca de giz com seu próprio nome tecido em letras minúsculas douradas repetidamente em cada listra.
Outras pessoas podem ver o narcisismo apenas como uma doença, classificada no DSM-5-TR como Transtorno de Personalidade Narcisista, uma condição mental grave que possui várias características e nuances, sendo as principais um senso inflado de superioridade, enorme nível de direito, exploração, empatia motivacional e autoconsciência prejudicada.
Muitos tiveram contato com esse lado do narcisismo após o lançamento viral em 2022 do livro I’m Glad My Mom Died ("Estou Feliz que Minha Mãe Morreu"), escrito por Jennette McCurdy, ex-estrela da série iCarly. Em 320 páginas, a atriz descreveu os traumas causado pela fama precoce em uma indústria da qual nunca quis fazer parte, mas foi forçada por sua mãe narcisista, Debbie, que morreu de câncer de mama em 2013.
Mas essa doença afeta apenas 1% da população e esse número permanece inalterado desde 1980. Portanto, quando falamos que cientificamente homens são mais narcisistas do que as mulheres, não estamos falando da condição patológica, apenas do traço básico, caracterizado por um senso grandioso de autoimportância, falta de empatia pelos outros, necessidade de admiração excessiva e a crença de que alguém é único e merece tratamento especial.
Até porque estamos falando de uma sociedade historicamente tendo a figura masculina como peão central, gerando a desvalorização sistemática das mulheres com base em estereótipos de gênero.
Segundo a literatura médica, as mulheres são duas vezes mais propensas do que os homens a desenvolverem depressão. Isso acontece devido à sensibilidade a fatores biológicos, como mudanças hormonais que acontecem na puberdade, problemas pré-menstruais, gravidez, experiências pós-parto, perimenopausa e menopausa. Elas também são vítimas das circunstâncias da vida e dos estressores culturais, como status de desigualdade, sobrecarga, abuso sexual ou físico e entre outros fatores.
Um estudo da Escola de Administração da Universidade de Buffalo, publicado na revista Psychological Bulletin, compilou 31 anos de pesquisas sobre narcisismo e descobriu que os homens consistentemente pontuaram mais alto em narcisismo em várias gerações e independente da idade do que as mulheres. Em três décadas, foram mais de 475 mil participantes do mundo todo.
A equipe de Emily Grijalva, líder do estudo e professora assistente de organização e recursos humanos da Escola de Administração da Universidade de Buffalo, estudaram as diferenças de gênero nos três aspectos do narcisismo: liderança/autoridade, grandiosidade/exibicionismo e senso deturpado de merecimento.
A maior lacuna que encontraram foi nesse merecimento não adquirido, mas autoimposto, em que é sugerido que os homens são mais propensos do que as mulheres a explorar os outros e se sentirem com direito a certos privilégios.
A segunda maior diferença foi no aspecto liderança/autoridade. Em comparação, os homens exibem mais assertividade e desejo de poder. Isso encontra a cultura em que homens não apenas ocupam mais cargos de liderança e no governo, mas também buscam mais por eles.
No entanto, não houve diferença na característica exibicionista, o que significa que ambos os sexos têm a mesma probabilidade de exibir vaidade. Em seu livro The Narcissist Next Door ("O Narcisista Ao Lado") o autor Jeffrey Kluger apontou que, em uma sociedade sexista, esse potencial é reprimido nas mulheres, enquanto encorajado nos homens desde cedo, tanto quanto a arrogância narcisista e a agressividade.
"Os indivíduos tendem a observar e aprender os papéis de gênero desde tenra idade e podem enfrentar reações adversas por se desviarem das expectativas da sociedade", disse Grijalva em um comunicado que acompanhou o estudo publicado. "As mulheres muitas vezes recebem críticas por serem agressivas ou autoritárias, o que as pressiona mais do que os homens, e acabam suprimindo demonstrações de comportamento narcisista."
Ou seja, as diferenças de personalidade, como o narcisismo, podem surgir de estereótipos e expectativas de gênero arraigados ao longo do tempo. Inclusive, a falta de mulheres em cargos de liderança pode resultar parcialmente na disparidade entre os estereótipos de feminilidade e liderança.
Segundo Kluger, a igualdade de gênero ainda é insuperável, embora esteja se curvando, o que também significará igualdade narcisista. O que espera, porém, é que as mulheres se comportem melhor do que os homens quando esse momento chegar.
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