Nicholas Alkemade, o homem que sobreviveu à maior queda do mundo

03/07/2020 às 14:003 min de leitura

Enfrentar as agruras de uma guerra parecia não ser o suficiente para o jovem Nicholas Stephen Alkemade. Nascido em 10 de dezembro de 1922, na cidade de Loughborough (Inglaterra), ele foi jardineiro antes de ser escalado pelo Esquadrão 115 para lutar na Segunda Guerra Mundial. Alkemade atuaria como um artilheiro atirador de cauda de uma aeronave, responsável pelo manuseamento de uma metralhadora posicionada na parte traseira da fuselagem.

O rapaz de 21 anos de idade e sua equipe concluíram com sucesso 14 operações, por isso foram designados para uma invasão em Berlim. Na noite de 24 de março de 1944, uma das 811 aeronaves destinadas para a missão, uma Lancaster II, decolou de Cambridgeshire às 18h48 com destino a Berlim, levando seus sete membros da tripulação.

Era o início do desespero.

Voo da morte

(Fonte: Taringa!/Reprodução)(Fonte: Taringa!/Reprodução)

O bombardeio à capital alemã foi um sucesso retumbante; já o retorno para a Grã Bretanha, nem um pouco. Indo para o sul, ventos atípicos empurraram o Lancaster II em direção ao Vale do Ruhr, uma região com forte concentração de defesas alemãs antiaéreas. O inevitável aconteceu.

Um caça noturno Junkers Ju 88, pilotado por Oberleutnant Heinz Rökker, interceptou o Lancaster II e o atacou por baixo com os disparos de metralhadoras. A asa de estibordo e a fuselagem da aeronave explodiram em chamas, inclusive quebrando o vidro de proteção da parte onde Alkemade estava, expondo-o ao gelo daquela noite.

O jovem artilheiro conseguiu disparar contra o inimigo com as suas quatro metralhadoras e destruí-lo, mas já era tarde demais para o Lancaster II, que embicou e começou a sua descida para a morte. O piloto James Arthur Newman ordenou que a tripulação se preparasse para pular, e assim o fizeram. Visto que a torre onde Alkemade ficava era estreita demais para que ele usasse um paraquedas, o dispositivo era armazenado em uma caixa na parte traseira da fuselagem para ser preso a um arnês. Portanto, ele foi deixado sozinho para realizar o procedimento de fuga.

(Fonte: Pinterest/Reprodução)(Fonte: Pinterest/Reprodução)

Quando Alkemade abriu a caixa, notou que o paraquedas estava pegando fogo. A máscara de oxigênio de borracha, apertada com força sobre a boca e o nariz, começou a colar em sua pele à medida que derretia. Foi então que ele percebeu que estava em chamas também. O incêndio tinha invadido as portas traseiras e queimava o fluido hidráulico da cúpula onde Alkemade estava.

Ele não via mais saída. Abandonado, o jovem despencava do céu em uma aeronave prestes a explodir. Tinha apenas a opção de ficar ou pular. Se ficasse, seria consumido pelo fogo até perder a consciência. Sendo assim, decidiu pular de vez e acabar com o seu tormento de maneira mais digna.

Sem equipamento nenhum, Nicholas Alkemade se jogou de 5,5 mil metros de altura.

O sobrevivente capturado

(Fonte: Notibras/Reprodução)(Fonte: Notibras/Reprodução)

Em relato a um jornal da época, o artilheiro disse que se lembrava de a noite estar muito quieta, interrompida apenas pelo ruído dos motores das aeronaves a distância. Ele não sentiu seu corpo caindo a 120 km/h; foi como se estivesse suspenso no espaço. Refletiu e se lamentou por nunca mais poder voltar para casa. Depois que o Lancaster II explodiu no ar, ele perdeu a consciência devido à dor que as chamas provocavam.

Com um joelho torcido e alguns arranhões, Alkemade acordou em uma floresta. A grande camada de neve fofa que cobria o chão amorteceu o impacto da queda, mas ainda parecia um sonho para o jovem. Provavelmente os galhos dos pinheiros muito altos também contribuíram para suavizar o pouso.

Incapaz de se mover, Alkemade soprou o seu apito de emergência até atrair a atenção de civis alemãs da Guarda Nacional. Morrer no gelo não era uma opção. Ele foi levado à enfermaria do Hospital Meschede e teve seus ferimentos tratados.

Agentes da Gestapo o conduziram para interrogatório no dia seguinte, e ele revelou com orgulho a sua história de sobrevivência, porém os nazistas não acreditaram. Então o jovem os desafiou a encontrarem o suporte de seu paraquedas. Uma busca realizada na floresta e nos destroços encontrados do Lancaster II a 32 quilômetros do local da queda comprovaram a verdade.

Alkemade recebeu uma espécie de certificado pelas forças do Terceiro Reich por seu feito extraordinário e foi fotografado pela imprensa alemã antes de ser enviado para Stalag Luft III, na Polônia. Entre os prisioneiros de guerra com quem ficou, ele se tornou uma celebridade, até ser repatriado em 1945.

Desafiando a morte

(Fonte: Defense World/Reprodução)(Fonte: Defense World/Reprodução)

Assim que retornou da guerra para a sua cidade natal, Alkemade encontrou um ótimo emprego em uma fábrica de produtos químicos. E como se não bastasse ter caído de quase 6 mil metros de altura, precisou desafiar a morte mais uma vez.

Enquanto ele removia o líquido de um gerador de gás de um reservatório de cloro, o equipamento usado recebeu um choque tão forte que deslocou a máscara de seu rosto, levando-o a respirar o gás venenoso. Alkemade sofreu por 15 minutos agonizantes antes que seus pedidos de ajuda fossem atendidos.

Pouco tempo depois, um tubo de sifão estourou e lançou ácido sulfúrico industrial nos braços e no rosto. Na sequência, o homem mergulhou a cabeça em um tambor de 40 litros de tinta para neutralizar a ação do ácido; consequentemente, ficou apenas com queimaduras de primeiro grau.

Depois de sobreviver a outro grave acidente, Alkemade se tornou vendedor de móveis e aproveitou uma vida tranquila ao lado de sua esposa e seus filhos. Em junho de 1987, faleceu de causas naturais.

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