Como o lítio revolucionou o tratamento para transtornos mentais

14/07/2022 às 04:002 min de leitura

O lítioque é o mais leve de todos os metais, é um elemento que serve para múltiplas funções, que vão da produção de eletrônicos ao uso como fonte de energia. Mas certamente o seu emprego mais louvável foi o impacto que ele teve (e tem) nos tratamentos das doenças psiquiátricas.

Isto por o lítio ser o princípio ativo que foi usado no primeiro medicamento psiquiátrico de todos os tempos, e transformou a vida de milhões de pessoas que sofriam de transtornos mentais. É esta história — que está contada no livro Lithium: a Doctor, a Drug and a Breakthrough, de Walter A. Brown — que será lembrada neste texto.

A descoberta do uso de lítio para os tratamentos mentais

(Fonte: Twitter)(Fonte: Twitter)

Esta história começa há mais de 70 anos. Foi em 1949 que um psiquiatra australiano chamado John Cade descobriu o uso do lítio como medicamento para o tratamento do transtorno bipolar, doença que afeta 1 a cada 100 pessoas no mundo todo.

O transtorno é seríssimo: sem tratamento adequado, a pessoa doente convive com um humor que se intercala entre altos e baixos emocionais. As pessoas com este transtorno são 20 vezes mais propensas a cometer suicídio em relação à população geral.

Segundo o autor Walter Brown, a descoberta de Cade foi muito impressionante, uma vez que ele não tinha acesso a tecnologias modernas da medicina nem a instalações muito adequadas. Portanto, sua pesquisa teve que ser feita por métodos mais simples e sem ajudantes.

Durante a Segunda Guerra Mundial, John Cade ficou responsável por três anos da seção psiquiátrica no campo de prisioneiros de guerra japoneses em Changi, em Cingapura. Lá, ele começou a notar que havia ligação entre deficiências alimentares e o aparecimento de doenças. 

Quando a guerra acabou, Cade continuou seu trabalho no Bundoora Repatriation Mental Hospital, na Austrália. Ele começou a fazer um experimento: coletava amostras de urina de pessoas com depressão, bipolaridade e esquizofrenia, a fim de verificar se algum elemento na urina poderia ter a ver com os sintomas apresentados por elas. Em seguida, ele injetava a urina em cobaias. Logo, começou a notar que a urina das pessoas com bipolaridade era especialmente letal para os animais,  pois era muito tóxica. 

Sua primeira hipótese era a questão do ácido úrico, mas ela se revelou falsa. Logo, o psiquiatra começou a testar também o carbonato de lítio (remédio que era usado apenas para o tratamento de gota) nestas cobaias. Passou a observar que o medicamento parecia acalmá-las: os roedores mais inquietos ficavam tranquilos. 

O uso do lítio no transtorno bipolar

(Fonte: Intramed)(Fonte: Intramed)

O próximo passo, então, seria usar o lítio em humanos, e Cade experimentou o remédio em 10 pacientes com bipolaridade. Segundo relatou em um artigo em 1949, estas pessoas passaram a ter melhoras rápidas e muito significativas.

Não significa que não houve entraves neste processo. O próprio artigo de Cade não foi levado muito a sério inicialmente, e seu método foi questionado. Como se trata de um metal, houve o medo de intoxicação dos pacientes - o que de fato acontecia, de acordo com a dose ministrada.

O que foi se descobrindo aos poucos é que o problema era a medida. Em doses adequadas, o lítio foi se revelando extremamente benéfico a alguns pacientes. Pessoas com transtorno bipolar passaram a ter menos variações de humor e, por consequência, diminuem-se os riscos de suicídio associados à doença.

Isso não significa que outras drogas não tenham sido inventadas desde 1949, mas o fato é que o lítio (que até hoje é usado) foi capaz de mudar a vida de milhares de pessoas que puderam finalmente ter melhores condições de vida.

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