Estilo de vida
11/07/2023 às 13:00•2 min de leitura
A terapia larval, uma técnica milenar que já era usada pelos maias no primeiro milênio, foi adaptada por cientistas americanos e começa a dar os primeiros passos no Brasil. Atualmente, uma bióloga da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) usa larvas de duas espécies de moscas criadas, alimentadas e esterilizadas para tratar feridas de difícil cicatrização.
Estudadas há quase trinta anos pela bióloga Patricia Thyssen, larvas das moscas Cochliomyia macellaria e a Chrysomya megacephala são colocadas sobre a pele em feridas infectadas causadas por diabetes ou úlceras venosas. Esses vermes devoram vorazmente o tecido morto (mas não o vivo) e secretam substâncias curativas, evitando o uso de antibióticos.
Como os antibióticos atuais têm perdido sua eficácia diante de bactérias resistentes, muitos profissionais de saúde estão recorrendo às larvas medicinais nas últimas décadas. O objetivo é tratar feridas crônicas e infectadas, que sejam resistentes aos antibióticos e curativos tradicionais, atualmente uma das dez maiores ameaças à saúde pública, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS)
Fonte: BioMonde/Divulgação.
Coube ao médico americano William Baer, tratando soldados franceses durante a Primeira Guerra Mundial em 1917, a redescoberta da terapia larval. A princípio, o profissional se horrorizou com a situação de dois soldados que tiveram feridas expostas na perda e no abdômen e passaram dias na trincheira sem tratamento, água ou comida.
Ao examinar os ferimentos infestados por larvas, Baer se surpreendeu com o fato de os pacientes não apresentarem febre nem sinais de infecções ou septicemia. "Quando observei a extensão das feridas, em particular na coxa, não pude deixar de ficar maravilhado com as boas condições dos pacientes", escreveu Baer em seu estudo que atestou o efeito positivo das larvas sobre as feridas.
Fonte: Patricia Thyssen/Unicamp/Divulgação.
Mais de um século após o trabalho de Baer, a terapia larval se modernizou, e é bem mais higiênica do que o observado nas trincheiras da Primeira Grande Guerra ou na civilização maia. Mas as moscas continuam: no Reino Unido, larvas são desinfetadas em laboratório e juntadas em pequenas bolsas biológicas permeáveis, parecidas a um saquinho de chá.
“As larvas não têm dentes: elas apenas secretam um líquido que atravessa a bolsa, digere e limpa a ferida. E daí elas engolem o líquido novamente — sempre dentro da bolsa”, explica à BBC News Brasil a médica Yamni Nigam, professora de Ciências Biomédicas da Universidade de Swansea, no País de Gales.
Enquanto isso, no Brasil, Patricia Thyssen continua produzindo suas larvas desinfectadas e enviando por Sedex para hospitais de vários locais do Brasil, onde chegam prontas para uso. O objetivo da bióloga agora é conduzir estudos clínicos randomizados que permitam validar a terapia milenar na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para disseminar o seu uso.