Ciência
04/03/2018 às 11:00•3 min de leitura
"Putz, esqueci". Provavelmente você concorda que essas e outras expressões de esquecimento são muito comuns entre todos os consumidores de conteúdos como livros, filmes e séries.
Hoje, na era da internet superveloz e do conteúdo intenso e volátil, é bastante frequente nos esquecermos até mesmo de notícias relativamente importantes que lemos poucos dias atrás... Até porque muitas pessoas apenas leem o título e a chamada de certas postagens, não é verdade?
Pamela Paul, editora do The New York Times Book Review, também concorda com isso. Quando o assunto é ler um livro, ela comenta que até lembra "da capa, da edição, de onde comprou ou de quem a presenteou com o livro", mas não de todo o resto. Ou seja: não lembra dos detalhes do conteúdo, da trama do livro mesmo.
A editora ainda relatou ao site The Atlantic que, imediatamente após terminar a leitura da biografia de Benjamin Franklin por Walter Isaacson, ela seria capaz de dar um panorama geral sobre a revolução dos Estados Unidos (retratada no livro). No entanto, dois dias depois ela não conseguiria apresentar sequer uma linha do tempo sobre essa revolução.
A nossa memória atua de uma forma bem intrigante e varia demais de acordo com cada pessoa, portanto o assunto desperta o interesse de especialistas de todo o globo. Enquanto muita gente consegue lembrar a trama de um filme visto apenas uma vez, outras pessoas encaram a experiência de assistir a filmes, ver séries ou ler livros como somente um passatempo... E de maneira praticamente literal, pois nesse caso o objetivo é apenas passar o tempo com conteúdos audiovisuais mesmo. Sendo assim, fica mais "fácil" esquecer os conteúdos consumidos.
Faria Sana, professora assistente de Psicologia na Universidade Athabasca (Canadá), diz que a "memória geralmente tem uma limitação bastante intrínseca; é essencialmente um gargalo". E isso realmente acontece, pois a famosa "curva do esquecimento" — que é mais abrupta nas primeiras 24 horas — é cruel. Se você não fixou algo depois do primeiro dia após o acontecimento (assistir a um episódio de uma série, por exemplo), é bem provável que você não se lembre de muitos detalhes nos dias seguintes.
Não é preciso dizer que a memória de cada um é única, portanto cada pessoa tem seu jeito e sua própria capacidade de guardar lembranças. Jared Horvath, pesquisador pela Universidade de Melbourne, comenta que a forma como as pessoas consomem informações e entretenimento mudou o "tipo" de memória que valorizamos. Esse "tipo de memória" não nos ajuda a recordar detalhes de um filme ao qual assistimos meses atrás.
Horvath ainda usa a "cartada da internet" para ressaltar que, hoje, o mais importante é lembrarmos ONDE acessamos tal conteúdo. É fundamental recordarmos o local no qual acessamos um artigo importante ou uma informação que consideramos essencial para um trabalho ou até mesmo um debate. Com diversos canais de vídeo, Wikipédia, blogs, sites informativos e muito mais, é mais relevante marcarmos o caminho pelo qual chegamos até algo do que o algo em si.
Experiências de entretenimento sempre são prazerosas, mas é bom criarmos certos espaços temporais entre elas se queremos condicionar bem nosso MMM. Estudos baseados em "binge-watching" (assistir a episódios de séries consecutivamente, sem parar, por muito tempo), conduzidos por Horvath e sua equipe, indicam que os "binge-watchers" tendem a esquecer conteúdos muito mais rapidamente que as pessoas que acompanham uma série assistindo a apenas um episódio por semana.
E isso se aplica a tudo. Aliás, é por essas e outras que muitos métodos escolares optam por espaçar bem determinados conteúdos em vez de abordar tudo de uma vez só. Quanto mais você exercita e acessa suas memórias, mais a sua memória em geral é fortalecida. Ler um livro "numa sentada" não é um jeito bom para que você consiga lembrá-lo depois (conceito reforçado também pela professora Faria Sana).
O ditado "lembrar é viver" se aplica perfeitamente à saúde, à vitalidade da nossa memória... Que muitas vezes falha miseravelmente, vira o oposto da famosa "memória de elefante".
Ian Crouch, redator do site The New Yorker, chega a questionar o nosso próprio interesse em ler, pois aponta as diversas falhas de atenção e lapsos de memória que acontecem. No entanto, por mais que Crouch afirme que nossa memória é "profundamente injusta" e que isso possa fazer parte de um pequeno drama existencial, o escritor reconhece que uma técnica simples para remediar o esquecimento é justamente ler os mesmos livros mais de uma vez.
Aqui, no Mega Curioso, já abordamos diversas possibilidades de fortalecimento da memória; e até mesmo tomar um cafezinho pode ajudar nossa cuca a funcionar melhor. Confira os links abaixo:
Pergunta simples: ao terminar de ler este artigo, você lembra o que foi dito no primeiro parágrafo? :P