Estilo de vida
11/04/2020 às 06:00•2 min de leitura
Árvores conservadas embaixo de lagos e braços de mar não são incomuns; toda a cidade de Veneza, na Itália, repousa sobre uma floresta de troncos enterrados na lama. Na costa do estado do Alabama, nos EUA, os troncos submersos de ciprestes onde, há 60 mil anos, havia um bosque poderão vir a ser o elemento principal para a fabricação de medicamentos e produção de enzimas industriais.
Hoje sob uma camada protetora de turfa e sedimentos, essas árvores estão sendo analisadas por cientistas das universidades Northeastern e de Utah, dentro de um programa financiado pelo Escritório de Exploração e Pesquisa Oceânica (OER, sigla em inglês) da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA), parte do Departamento de Comércio dos EUA.
O bosque de ciprestes nasceu, se desenvolveu e morreu às margens de um rio pré-histórico. E foi o túmulo inicial das árvores que caíam em seu leito, posteriormente coberto pelo mar quando o nível dos oceanos subiu e a linha da costa retrocedeu. Ocultos por sedimentos, os troncos foram revelados pela fúria do furacão Ivan que, em 2004, varreu a costa do Golfo do México e revolveu o fundo do mar.
Um tronco da antiga floresta de ciprestes, agora submersa, é recolhido no Golfo do México.
Porém, foi somente em dezembro de 2019 que equipes de cientistas começaram a trazer à superfície amostras dos troncos – que, mesmo enterrados por 60 mil anos, estão inteiros por causa da falta de oxigênio, o que impediu a sua decomposição.
"Mergulhar ali traz uma sensação estranha de voltar no tempo: a madeira ainda range e mantém sua cor internamente", disse à CNN o professor de Ciências Marinhas e Ambientais da Northeastern University Brian Helmuth.
Os troncos conservados sob o fundo do antigo rio não apenas deram uma visão do passado geológico da região como se mostraram uma verdadeira fazenda de animais marinhos e seus micro-organismos simbióticos. Essa fauna é alvo da pesquisa por seu valor biofarmacêutico e biotecnológico.
Dentre os mais de 300 animais encontrados na madeira já examinada, um pequenino molusco tornou-se o objeto de estudo das equipes. Ele age como um “cupim do mar”: como seus primos terrestres, escava a madeira pré-histórica, se alimentando dela.
Os cientistas se concentraram nele por conta de um estudo anterior, feito com bactérias encontradas em vermes marinhos extraídos de madeira de navios, que resultou em um antibiótico ainda em testes. Medicamentos feitos a partir de micróbios simbióticos produzem menos toxicidade do que bactérias de vida livre.
No caso da floresta submersa do Alabama, os pesquisadores extraíram cem estirpes de bactérias, muitas desconhecidas. O trabalho de sequenciamento do genoma já começou em 12 cepas, visando novos medicamentos e, no caso das enzimas produzidas por elas na digestão da madeira, seu uso na produção de papel, têxteis, alimentos e combustíveis renováveis.
Com a pandemia de covid-19, as universidades restringiram o trabalho aos laboratórios. “Esperamos conseguir robôs subaquáticos para filmar e fotografar a floresta submersa, o que vai nos permitir simular em 3D como ela era e registrá-la para o mundo”, explicou à CNN o técnico-chefe do Laboratório Helmuth, no Centro de Ciências Marinhas da Northeastern University, Francis Choi.
Floresta submersa há 60 mil anos pode ser fonte de novos remédios via TecMundo