Artes/cultura
09/06/2020 às 04:48•3 min de leitura
Dois estudos publicados simultaneamente pela revista Nature apontam que medidas restritivas mais extremas para evitar a disseminação do novo coronavírus podem ter sido responsáveis por evitar 348,1 milhões de novas infecções. Os levantamentos foram realizados em três regiões: China (prevenindo 285 milhões de novos casos), Estados Unidos (60 milhões) e países europeus (3,1 milhões). Somente na Europa, estima-se uma queda de 82% das contaminações.
Solomon Hsiang, diretor do Laboratório de Políticas Globais da Universidade da Califórnia em Berkeley, afirma que o cenário atual seria completamente diferente se tais ações não tivessem entrado em prática. “A doença estava se espalhando em uma taxa extraordinária, mesmo considerando outras condições infecciosas. A resposta à covid-19 resultou em mais vidas salvas em um curto período que qualquer precedente”. Solomon foi o líder das pesquisas realizadas em seis países: China, EUA, França, Itália, Irã e Coreia do Sul.
Infelizmente, segundo Samir Bhatt, líder da segunda pesquisa, realizada pelo Imperial College London, a pandemia está longe de acabar, uma vez que somente cerca de 3% a 4% das pessoas foram infectadas até o momento. “Este é apenas o começo. Estamos muito longe da imunidade de rebanho. O risco de uma segunda onda caso todas as medidas sejam deixadas de lado é real”.
Ainda assim, considerando o cenário alarmante e o número de vidas perdidas, tais ações foram responsáveis por salvar, ao menos por enquanto, milhões de pessoas.
A pesquisa realizada em Berkeley utilizou como metodologia um estudo econométrico – que se vale de um conjunto de ferramentas estatísticas para entender a relação entre variáveis através da aplicação de um modelo matemático. Neste caso, cerca de 1.717 intervenções foram consideradas, como quarentena, distanciamento social, fechamento de escolas, banimento de viagens e outras.
A partir da análise de dados coletados sobre a pandemia antes da aplicação dessas ações e depois delas, foi possível entender seus impactos sobre a disseminação da covid-19. Com os resultados oficiais de testagens divulgados por governos, eles realizaram uma projeção considerando, também, a subnotificação, que representa aqueles que se contaminaram e não chegaram a ser incluídos nas estimativas. Aí, os cientistas chegaram à soma astronômica de 530 milhões de casos evitados somente nos seis países avaliados.
Ainda assim, levaram em conta apenas dados oficiais, indicando 62 milhões de infecções prevenidas nesses países. Somente nos EUA, cerca de 4,8 milhões de diagnósticos – ou 60 milhões de contaminações, com as projeções fora dos gráficos de testagem.
Se por um lado há diversas críticas relacionadas às altas taxas de desemprego e aos colapsos econômicos, a equipe de pesquisadores salienta que esses são apenas os custos visíveis. Os benefícios das medidas são todos invisíveis, envolvendo “infecções que nunca ocorreram e mortes que não aconteceram”. Tais estimativas, claro, são resultado de uma incerteza muito grande, uma vez que variam de país para país e são alteradas de acordo com o comportamento regional e as informações fornecidas.
Como os efeitos negativos na economia são responsáveis por inúmeros problemas adicionais, Jennifer Nuzzo, epidemiologista do Centro de Segurança Sanitária da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg, diz que um equilíbrio deve ser encontrado – o que só é possível com uma testagem eficiente e expansão dos serviços de saúde. Ela não participou dos estudos e, mesmo considerando a importância do lockdown, é categórica: “Qualquer redução das ocorrências é temporária”.
Diante de números conflitantes e da especificidade dos estudos, os cientistas de ambas as pesquisas não falam de políticas públicas, se limitando a declarar que não pretendem, com seus dados, sugerir todos devam encerrar atividades para sempre. Jennifer Nuzzo, entretanto, faz uma consideração a respeito do papel real das medidas analisadas: “Os bloqueios foram um botão de pausa, não uma cura”.
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