Estilo de vida
07/03/2023 às 04:00•2 min de leitura
No livro O último abraço da matriarca, o zoólogo Frans de Waal descreve uma série de casos que revelam o quão complexa é a emoção dos animais e como ela afeta a maneira como eles vivem na natureza entre si e com outras espécies. Mas não é necessário ir tão longe para testemunhar animais com vida social. Cães, gatos e aves também são conhecidos por se relacionarem de maneira muito intensa entre si.
O que muita gente não sabe, é que isso também se aplica aos animais de fazenda, como no caso dos rebanhos bovinos. As vacas possuem uma vida social fascinante e apresentam hierarquias sociais que podem ser muito eficientes para resolver conflitos nos rebanhos.
(Fonte: Getty Images)
Em uma fazenda no Maine, no nordeste dos Estados Unidos, funciona o Peace Ridge Sanctuary. Este santuário de animais de fazenda abriga atualmente mais de 400 animais resgatados como cavalos, burros, cabras, ovelhas, gansos, coelhos e porcos. Existem ainda cerca de 50 vacas, que vivem em um rebanho com uma hierarquia social bastante interessante.
Theo é o patriarca do grupo. Ele é um animal grande — com mais de dois metros e pesando uma tonelada —, mas com um comportamento bastante gentil. Daniella Tessier, fundadora do santuário, descreve Theo como um tio amigável. Ele mantém os bezerros sob sua proteção, e constantemente os agrada com uma lambida reconfortante e carinhosa. Porém, esse comportamento às vezes pode se tornar um problema para resolver conflitos.
Quando Sammy, um jovem de seis anos, atingiu a adolescência, ele decidiu confrontar Theo. Como o patriarca não tinha um comportamento violento, Sammy — que já era maior do que ele — começou a se mostrar mais agressivo para tentar assumir sua posição.
Porém, antes que a situação escalasse para um nível de mais violência, surgiu Clementine, a matriarca do rebanho. Percebendo o que estava acontecendo, ela foi até o novilho, empurrou-o para fora do caminho e o desafiou. Sammy ficou atordoado com a reação e mudou seu comportamento novamente. Theo e Sammy têm sido amigos desde então.
(Fonte: Getty Images)
Tessier comenta que existe uma hierarquia em Peace Ridge, mas ela não é determinada apenas pelo domínio físico. Clementine mantém sua posição social por ser a mais velha e experiente do rebanho. A vaca — que está longe de ser a maior ou a mais forte, e que sequer tem chifres — é conhecida por manter as boas relações entre as demais vacas e bois.
“Clementine está sempre olhando em volta para garantir que todos estejam bem”, diz Tessier. “Ela é uma pacificadora ativa. [Quando o clima esquenta], Ela chega e diz: ‘Não ultrapasse essa linha’. E todo mundo a ouve, embora ela seja uma vaca mais velha e menor. Isso mantém as coisas em equilíbrio”.
Assim como outros animais, as interações entre os membros de um rebanho possui uma grande importância para as vacas. As lambidas, por exemplo, mais do que higiene, são importantes para reduzir a tensão e aumentar a confiança entre os indivíduos — algo parecido com o que acontece com alguns primatas.
Há muito tempo os biólogos descrevem hierarquias em rebanhos selvagens. Porém, para os rebanhos de criação é mais complicado observar relações hierárquicas bem estabelecidas. Como esses animais passam pouco tempo juntos, fica difícil identificar como funciona a interação entre eles.
“Quando um agricultor troca seu rebanho [ou parte dele], ele está interrompendo qualquer hierarquia social possível”, explica Tessier. “Pode ser que a cada seis meses ou um ano, os membros sejam retirados. Isso acaba com relacionamentos que você poderia ter observado. Porém, quando você interage com grupos que conseguem permanecer intactos, você pode ver imediatamente que eles têm relacionamentos complexos. E há muita expressão de afeto, carinho e cuidado genuíno”.