Estilo de vida
04/12/2023 às 06:30•2 min de leitura
A capacidade do cérebro humano de se adaptar e mudar, conhecida como neuroplasticidade, sempre fascinou cientistas e o público em geral. A esperança de que o cérebro possa se reorganizar dramaticamente para superar desafios neurológicos, como cegueira e derrame, cativa a imaginação.
No entanto, um artigo recente escrito por John Krakauer e Tamar Makin sugere que talvez as narrativas de "reorganização" precisem ser reconsideradas. Os autores analisaram estudos clássicos para reavaliar crenças de longa data sobre a reorganização cortical e a neuroplasticidade. Suas descobertas intrigantes desafiam ideias anteriormente aceitas sobre a verdadeira natureza da plasticidade cerebral.
Michael Merzenich. (Fonte: Michael Merzenich / Reprodução)
A fascinação contemporânea pela neuroplasticidade tem suas raízes no trabalho pioneiro de Michael Merzenich, baseado nos estudos dos vencedores do Prêmio Nobel, David Hubel e Torsten Wiesel. Hubel e Wiesel estudaram o funcionamento do sistema visual em gatinhos. Os experimentos em gatinhos sugeriam uma reorganização funcional; contudo, estudos em gatos adultos não conseguiram replicar essas mudanças significativas, deixando em aberto a plasticidade extrema do cérebro adulto.
Nesse sentido, o trabalho de Merzenich sugeria, inicialmente, uma capacidade extraordinária do cérebro adulto para se reorganizar após amputações. Entretanto, Krakauer e Makin realizaram uma análise mais profunda sobre as conclusões do estudo de Merzenich, revelando que a chamada "reorganização" pode ser mais sobre aprimorar ou modificar arquiteturas neurais preexistentes do que criar novas funções em áreas anteriormente não relacionadas. A plasticidade, nesse contexto, parece ser mais sutil do que as narrativas de mudanças dramáticas nos mapas cerebrais.
(Fonte: Getty Images / Reprodução)
A pesquisa de Krakauer e Makin desafia a noção de que o cérebro, em resposta a lesões, comanda novos territórios neurais. Em vez disso, sugere que a neuroplasticidade está mais relacionada à exploração de capacidades latentes presentes desde o nascimento. A habilidade de pessoas cegas navegarem com base na ecolocalização ou sobreviventes de derrame recuperarem funções motoras, conforme indicado pela pesquisa, está enraizada no "poder do treinamento e da aprendizagem". A verdadeira transformação neuroplástica, portanto, parece exigir esforço persistente e prática intensiva.
Compreender a verdadeira natureza e os limites da plasticidade cerebral é crucial tanto para estabelecer expectativas realistas para os pacientes quanto para orientar os profissionais clínicos em suas abordagens de reabilitação. Ao contrário de uma transformação mágica, trata-se de uma jornada de dedicação, resiliência e progresso gradual.
Em última análise, o mito de uma reorganização cerebral funcional pode ser mais fictício do que factual. Embora o cérebro humano seja, de fato, incrivelmente adaptável, sua verdadeira força reside na capacidade de refinar e aprimorar as capacidades já existentes. A neuroplasticidade não é tanto sobre a criação de novas fronteiras no cérebro, mas sobre desbloquear o potencial latente e moldar as habilidades preexistentes.