Fezes felinas com toxoplasmose podem estar matando lontras marinhas

01/01/2024 às 10:002 min de leitura

Após várias lontras marinhas terem morrido ao longo da costa da Califórnia, nos Estados Unidos, cientistas decidiram investigar o mistério e descobriram um par improvável de culpados: uma cepa inusitada do parasita Toxoplasma gondii, causador da toxoplasmose, e as fezes de um grupo de felinos. Segundo os pesquisadores, quatro lontras foram encontradas mortas entre fevereiro de 2020 e março de 2022 na região.

Sabe-se que esta espécie pode ser especialmente vulnerável a infecções de Toxoplasma gondii, um parasita unicelular encontrado em todo o mundo e que comumente infecta gatos domésticos. Ele também costuma infectar humanos e suspeita-se que altere até mesmo o nosso comportamento. Contudo, no caso das lontras, a situação parecia mais complexa. 

Casos raros

(Fonte: GettyImages)(Fonte: GettyImages)

Estranhamente, as lontras encontradas na Califórnia sofriam de uma grave inflamação da gordura corporal, um sintoma inesperado para lontras marinhas com toxoplasmose. Seus corpos também foram infestados pelo parasita, mas seus cérebros pareciam relativamente intocados — algo incomum, uma vez que o parasita normalmente infecta o sistema nervoso de seus hospedeiros.

“Estudei infecções por Toxoplasma em lontras marinhas durante 25 anos e nunca vi lesões tão graves ou números elevados de parasitas”, disse a autora do estudo e membro do Departamento de Pesca e Vida Selvagem da Califórnia, Melissa Miller, em comunicado oficial. Investigando os quatro casos, os cientistas descobriram que as lontras marinhas estavam infectadas com uma cepa rara do parasita T. gondii que nunca havia sido relatada em animais aquáticos antes. 

Os cientistas apelidaram a cepa de "COUG", pois foi encontrada pela primeira vez em pumas canadenses após um surto próximo entre humanos em meados da década de 1990. Desde então, foi identificado em muitos outros animais e é particularmente virulento em ratos. A presença da cepa incomum COUG em animais marinhos fez os pesquisadores se questionarem: como o parasita foi parar na barriga dessas criaturas costeiras?

Impacto da toxoplasmose

(Fonte: GettyImages)(Fonte: GettyImages)

Os pesquisadores publicaram um estudo que relatou que todas as mortes ocorreram durante períodos de alta pluviosidade e aumento do escoamento de água. Na visão dos cientistas, é possível que os gatos selvagens infectados tenham feito cocô em terra e o parasita tenha chegado à costa, onde residiu em caracóis e mariscos comidos pelas lontras marinhas. 

Os investigadores também observam que esta via até então desconhecida pode afetar outros animais suscetíveis à infecção por Toxoplasma — incluindo os seres humanos. Afinal, o consumo de ostras, mexilhões e outros mariscos é relativamente comum para diversas culturas. Nos EUA, estima-se que 11% da população humana tenha sido infectada pelo parasita em questão. Em outras partes do mundo, a taxa de infecção pode ultrapassar os 60%.

Humanos infectados geralmente não apresentam muitos sintomas físicos, a menos que o hospedeiro esteja imunocomprometido. No entanto, a infecção tem sido associada a uma série de mudanças comportamentais bizarras nas pessoas. Estudos sugerem que alguns indivíduos infectados com toxoplasmose são mais impulsivos e têm até mesmo maiores probabilidades de se envolver em um acidente de carro fatal. 

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