Estilo de vida
10/08/2024 às 14:00•2 min de leituraAtualizado em 10/08/2024 às 14:00
Se você algum dia visitar a Índia, certamente passará longe do Boragaon, em Guwahati. Nesse local, onde funciona um dos maiores lixões do país, um bando de cegonhas de aspecto assustador revira os detritos em busca de comida. São as hargilas (Leptoptilos dubius), espécie de marabu, um grupo de grandes cegonhas da família Ciconiidae.
Parecidas com os nossos urubus, as hargilas chegam a quase 1,5 m de altura e asas que, quando abertas, chegam a 2,4 metros. De porte altivo, elas têm olhos de cor azul-gelo e grandes bicos em forma de cunha. A pele dos seus pescoços pelados vai do amarelo ao vermelho-laranja, cuja base carrega uma bolsa inflável e enrugada de propósito desconhecido.
Como saídas de uma galeria de vilões de um desenho animado infantil, as hargilas têm esses nomes porque, na língua assamesa, do estado onde fica o lixão, isso significa "engolidores de ossos". E essa é realmente uma de suas maiores habilidade, pois as aves são necrófagas e frequentemente vistas com grandes nacos de carniça em seus bicos.
Por ser um pássaro de aspecto sujo, embora sejam agentes ecológicos do meio ambiente, as hargilas são perseguidas às vezes por puro preconceito, e histórias supersticiosas de que transmitem doenças ou são um mau presságio. Por isso, algumas essas cegonhas estão se tornando raríssimas, com uma população mundial entre apenas 800 a 1,2 mil indivíduos.
As hargilas são aves de nidificação coloniais, o que significa que têm suas árvores preferidas para reprodução, retornando anualmente aos mesmos locais. Por isso, explica a bióloga Purnima Devi Barman, a perda de suas árvores nidificantes, além da destruição do habitat e da drenagem de pântanos, teve grande impacto na redução da população de hargilas na Índia.
Ela conta à plataforma Atlas Obscura que, quando seus filhos tinham dois anos e meio, testemunhou um homem cortando uma árvore de nidificação, derrubando os filhotes no chão. Vê-los tão indefesos, ao lado dos seus próprios filhos, fez com que ela decidisse salvar essas aves. Em 2007, ela fundou um grupo de conservação chamado Exército Hargila.
Fundado sem nenhum tipo de planejamento por Barman, o Exército de Hargila é um movimento de base rural, coordenado por mulheres. Quando a mulher entra para o exército, ela se compromete a educar o marido sobre visões preconceituosas e atrasadas sobre as hargilas.
Dessa forma, elas mostram ao mundo que o “mau presságio” pode ser um símbolo de resistência.
Mas o grande ponto de inflexão do movimento foi quando a sororidade decidiu incorporar a hargila à gamosa, uma toalha ritual retangular de bordas vermelhas, feita de algodão, que é um dos presentes mais cobiçados na região do Assam.