Estilo de vida
21/04/2023 às 04:00•3 min de leitura
Originária de Angola, a tribo Himba, formada por aproximadamente 50 mil pessoas, é considerada um povo seminômade e se destaca como um dos últimos descendentes de seu grupo a restar no continente africano. Mas apesar da estratégia centenária de preservar sua cultura em locais praticamente isolados, ela vem enfrentando as "ameaças" da modernidade, resultando em alterações significativas no comportamento e na percepção de mundo.
Os primeiros assentamentos Himba datam do início do século XVI, quando os povos cruzaram a fronteira angolana e escolheram Kaokoland como sua nova pátria. Naquela época, o termo aplicado para a cultura ainda não era utilizado devido à separação recente da tribo Herero, e ganhou força apenas séculos depois, quando migraram para o atual território da Namíbia em busca de solos mais férteis. Assim, se instalaram em uma zona quente e seca que favoreceu o isolamento.
O nome "himba" vem do dialeto otjiherero e significa "mendigo". Apesar do tom relativamente depreciativo, ele funciona como um símbolo de superação para os seminômades, já que remete a uma história de perseguição e marginalização desse povo causada por outras tribos Herero, como os Swartbooi e os Topnaan. Esse processo de cisma, ocorrido entre grupos do sul e do norte, marca a luta constante pela sobrevivência, onde até mesmo crises, como uma epidemia bovina, chegaram a restringir o acesso a colheitas e busca de gado em territórios extensivos.
(Fonte: BBC / Reprodução)
Tradicionalmente, a tribo africana é monoteísta, ou seja, acredita em um único deus intitulado Mukuru. Além disso, suas crenças sugerem uma forte adoração à beleza feminina e à preservação de sua vaidade, com casos mais extremos impedindo que as mulheres tomem banho por longos períodos para não "afetar" suas características físicas. A cultura também exalta o uso da substância vermelho-ocre proveniente de hematitas para servir como pintura corporal antirradiação solar, além da dieta baseada na ingestão de mingau de milho e a prática ritualística de grandes queimadas para formalizar a comunicação com o ente supremo.
Foi apenas com o advento da modernidade, em especial na segunda metade do século XX, que os Himba passaram a adotar um novo estilo de vida. As mulheres continuam tomando conta da aldeia e caminham quilômetros para coletar lenha e água, enquanto os homens e meninos ajudam com a criação de animais e com atividades que envolvam força física e liderança. Porém, as dinâmicas não são mais as mesmas.
As tecnologias, a velocidade de comunicação e deslocamento, e as vantagens oferecidas pelo mundo exterior forçaram o abandono da vila por parte dos mais jovens. Enquanto isso, a abertura do território para pessoas de fora acabou exigindo que os líderes locais mudassem seus hábitos para receber visitantes, trocando de roupas para trajes mais casuais e "apresentáveis".
Em entrevista ao BBC, Owen Kataparo, um homem Himba que cresceu em Omuhoro, Namíbia, e empresário de sucesso no país, disse que tem medo das mudanças rápidas ocorridas na comunidade. “Quando estou com roupas tradicionais fora da aldeia, recebo olhares estranhos. Tenho alguns negócios e as pessoas me tratam com mais respeito quando pareço com elas, me levam mais a sério”, comenta.
(Fonte: BBC / Reprodução)
Segundo ele, homens e mulheres o veem como uma pessoa que prosperou mundo afora, mostrando o que é possível realizar caso haja esforços para "deixar a aldeia para a cidade e tentar encontrar um emprego". Porém, diante de possíveis tentativas fracassadas, os problemas da cidade grande também chegam aos Himba, incluindo tendências ao consumo de álcool e transtornos psicológicos, como depressão e ansiedade.
O chefe Nongaba, da vila de Omuhoro, reforça que os dilemas são inevitáveis e o apego ao passado pode trazer prejuízos, impedindo que os filhos de moradores mais antigos possam explorar as possibilidades nas cidades próximas. Enquanto os mais velhos se sentem despreparados para enfrentar os novos desafios do século XXI, os mais novos são estimulados através do estudo, das mudanças de comportamento, da readaptação e de outras práticas que os preparem para o sonho futuro.
"Quero que se tornem médicos, professores, trabalhem no governo. Quero que vivam uma vida diferente da minha, quero que se pareçam com você", diz ele. “O mundo mudou”.