Como edifícios residenciais estão afetando nossa psicologia social?

16/11/2023 às 14:004 min de leitura

O homem sempre foi obcecado por estruturas megalomaníacas. Mesmo quando ainda detinha poucos recursos tecnológicos, sua vontade em escalar grandes alturas surpreenderam. Foram várias as motivações ao longo dos milênios para construir cada vez mais em direção ao céu, entre elas, religião, poder, nacionalismo, comércio, design e democracia.

Construída por volta de 2560 a.C., a Pirâmide de Quéops, também conhecida como Grande Pirâmide de Gizé, no Egito, é considerada uma das estruturas mais altas da Antiguidade. Acredita-se que a altura original da estrutura era de cerca de 146,6 metros, colocando-a como a mais alta do mundo por 4 mil anos, até que a Catedral de Lincoln, na Inglaterra, com seus 160 metros, a superasse ao ser construída no século XIV.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Os antigos egípcios construíram suas pirâmides para proteger do tempo e dos inimigos os corpos mumificados de seus faraós, mas também celebrar e honrar seu poder e relevância. Os cristãos, por outro lado, usaram as inovações de engenharia gótica, como contrafortes voadores e arcos abobadados, para construir catedrais que se estendiam em direção ao céu como se quisessem aproximar os humanos do divino, além de ser uma alegoria à ascensão do espírito no final da vida. 

Em 1973, quando a Industrious American construiu o famoso World Trade Center para fazer de Nova York o pináculo dos negócios internacionais, começava a segunda geração dos edifícios altos, possibilitando que essas unidades também fossem residenciais. Atualmente, Nova York possui 430 mil edifícios residenciais e as estimativas é que o número aumente nas próximas décadas, mas poucas pessoas pararam para pensar como edifícios residenciais afetam nossa psicologia social.

O subúrbio e o preconceito à verticalização

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

A psicologia por trás da obsessão por estruturas altas é a mesma que permeia a atração por muros ou paredes, construídos por razões de poder, proteção e política, como foi o caso do Muro de Berlim. Assim como as paredes, os prédios também são símbolos de poder e riqueza, exemplos das habilidades de engenharia de um país, que ontem e hoje ainda são muito importantes e podem ser interpretadas como uma forma de intimidação.

No campo da psicologia ambiental, que nada mais é do que o estudo sobre a interação humana com seu entorno, a experiência do usuário — ou seja, como reagimos ao espaço, à forma, à cor e à luz —, é algo considerado essencial. Cada vez mais, edifícios altos são vistos como sinônimo de acomodações luxuosas, seja para escritórios, residências ou hotéis, colocando as vivências monetárias, muitas vezes, em perspectiva. Mas nem sempre foi assim.

Para alguns países, como os Estados Unidos, o pós-Segunda Guerra Mundial trouxe várias transformações, sobretudo de caráter econômico, gerando um rápido crescimento que levou a uma expansão das cidades e ao desenvolvimento de áreas urbanas. Isso possibilitou que mais pessoas se mudassem e constituíssem os subúrbios, associados a um estilo de vida mais tranquilo, familiar e economicamente bom. Afinal, as pessoas tinham acesso a casas maiores, terrenos espaçosos e um padrão de vida considerado elevado dentro de suas limitações.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Por outro lado, cresceu o preconceito contra o que algumas pessoas viam como a uniformidade e a falta de diversidade cultural nos subúrbios. Ao longo de toda a primeira metade do século XX, o movimento modernista promoveu ideias de habitação coletiva e designs inovadores para a arquitetura, pensando exatamente em edifícios residenciais, que em um espaço limitado, poderiam agrupar uma quantidade maior de pessoas. Essa verticalização do conceito do lar gerou uma imensa preocupação na população média, que alegava que isso sacrificava o conforto e a individualidade em nome da funcionalidade e da estética.

Foi assim em algumas partes do mundo, como em Hong Kong, onde viver em edifícios foi – e ainda é – um preconceito, que só se faz necessário devido a uma histórica falta de espaço. No Reino Unido, por exemplo, na década de 1950 e 1960, edifícios residenciais eram considerados o oposto do luxo e o estigma da habitação social da segunda metade do século XX, e isso custou a desaparecer. Foram essas duas percepções que ajudaram a moldar a ideia central em relação a viver nesses prédios altos.

O isolamento social

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

É estimado que 60% da população mundial esteja vivendo em centros urbanos até 2050, o que significa que é preciso encontrar moradia para cerca de 2,5 bilhões de pessoas até lá, sendo que a terra urbana se tornou um recurso cada vez mais limitado. Não é para menos que governos de alguns países estão pensando em alternativas para dar um jeito no problema, como fez a França com seu projeto "Reinvent Paris 2", que pedia a designers que criassem usos para terrenos urbanos atualmente não utilizados ou subutilizados.

Para se ter ideia, um estudo encomendado em 2017 pela National Apartment Association (NAA), National Multifamily Housing Council (NMHC) e conduzido pela Hoyt Advisory Services (HAS) mostrou que, para atender à crescente demanda, os EUA precisam construir pelo menos 4,6 milhões de novos apartamentos até 2030. Tudo isso para conseguir comportar a leva de jovens adultos que buscam a casa própria, a população envelhecida que procura segurança, e os imigrantes, responsáveis por cerca de metade de todo o novo crescimento populacional dos EUA até 2030.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Para atender à demanda, significa que os EUA precisam construir mais de 325 mil novas casas de apartamentos a cada ano, um número que o setor não conseguirá atingir até a década seguinte. Um artigo publicado em 2016 na Science Direct analisou e criticou a falta de dados e pesquisas sobre como essa quantidade de edifícios cada vez mais altos pode afetar nossa psicologia social.

No romance A Revolta de Atlas, de Ayn Rand, a protagonista Dagny Taggart, do alto do seu escritório, olha para outros arranha-céus distantes e se questiona se em algum deles está seu interesse romântico, se ele poderia estar a observando de volta. São essas noções de público e privado, distância e intimidade, que os pesquisadores discutem sobre como são fronteiras borradas em uma era em que estamos mais próximos de nos isolar completamente em torres altas.

O caminho para cima

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Em Uma exploração das funções da arquitetura monumental religiosa a partir de uma perspectiva darwiniana, publicado na SageJournals, foi abordado como colocar as pessoas em relações de níveis pode desencadear um sentimento de inferioridade com relação à pessoa que vive sob o peso "esmagador" daqueles que estão acima. Assim como aqueles que habitam andares mais altos podem se sentir superiores aos seus vizinhos em algum nível.

Uma vez que não há estudos diretos, pesquisas relacionadas concluíram que prédios altos não são um bom ambiente para as pessoas porque muitas tendem a manifestar sentimentos de depressão devido à sensação progressiva de isolamento. Os arranha-céus, compactos e cada vez mais altos e aglomerados, podem levar a sintomas similares de estresse psicológico experimentando por milhares de pessoas durante a pandemia de covid-19.

(Fonte: GettyImages/Reprodução)(Fonte: GettyImages/Reprodução)

Inclusive, segundo Jeffrey Hall, professor de Estudos de Comunicação e diretor do Laboratório de Relações e Tecnologia da Universidade do Kansas, o isolamento social exacerbou a indisponibilidade das pessoas a interação humana, muito mais do que qualquer interação com a tecnologia.

E esses são apenas alguns fatores das consequências psicológicas, admitidas ou não, de habitar edifícios cada vez mais altos. Claro, os avanços na tecnologia e o uso de áreas de entretenimento em comum podem ajudar a reduzir o avanço do efeito, mas não o caminho para cima que estamos indo – visto que para os lados já não é mais uma opção.

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