Caso Escadinha: a fuga presidiária mais surpreendente da história do Brasil

13/02/2024 às 06:304 min de leitura

José Carlos dos Reis Encina, mais conhecido como Escadinha, foi preso 5 vezes antes do fatídico ano de 1985. Isso porque um delegado chegou a afirmar que o criminoso não passava de mais um peão no tráfico de drogas e que estava muito longe de ser um traficante respeitado e de porte. Só que nada disso condizia com a história de Escadinha, tampouco com sua trajetória.

Isso até poderia ser verdade se, no momento em que foi finalmente preso, ele apenas estivesse carregando uma arma na cintura e não tivesse uma extensa ficha criminal, como aconteceu em setembro de 1974, no auge dos seus 19 anos. Escadinha foi surpreendido por policiais enquanto subia um morro na Piedade, no Rio de Janeiro, sendo autuado em flagrante, condenado a pagar uma multa e libertado em seguida.

No entanto, no dia em que foi preso por acaso, em 1985, ele simplesmente já tinha 6 passagens pela polícia e era um dos fundadores, junto ao irmão Paulo Maluco, da organização criminosa Falange Vermelha, que mais tarde se tornou o Comando Vermelho (CV).

Essa é a história do Caso Escadinha, a fuga presidiária mais surpreendente da história do Brasil.

Segurança máxima

(Fonte: Sind Sistema/Reprodução)(Fonte: Sind Sistema/Reprodução)

Nascido em 21 de maio de 1956, no Morro do Juramento, uma favela situada no bairro Vicente de Carvalho, Rio de Janeiro, foi lá que Escadinha iniciou sua vida no crime e onde também montou seu quartel-general. Em novembro de 1976, dois anos após ter sido fichado pela primeira vez, o criminoso foi preso por tráfico de drogas. Em 1980, novamente, mas por porte de arma, tráfico de drogas e formação de quadrilha.

Um ano depois, a polícia pegou Escadinha e o autuou por porte de armas, mas novamente ele foi liberado. Sua ficha engrossou depois de 1982, quando ele se envolveu em três latrocínios (roubo seguido de morte).

Em 1986, Escadinha foi preso por acaso enquanto saía da Favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio. Ele foi condenado a 30 anos de prisão em regime fechado e designado ao antigo Instituto Penal Cândido Mendes, anteriormente Colônia Penal Dois Rios, situado na Ilha Grande, litoral sul do Rio.

Fundado em 1884 por ordem de Dom Pedro II, o local foi um hospital-colônia para tratar viajantes que chegavam da Europa e estavam contaminados por lepra ou cólera. O edifício era dividido em três pavilhões que separavam os doentes que eram ricos e podiam andar pelas dependências da instituição, dos pobres, que eram amontoados em um prédio próximo à baía.

Escadinha. (Fonte: Reprodução)Escadinha. (Fonte: Reprodução)

Em meados de 1913, o lazareto foi desativado e voltou à ativa apenas em 1939, quando o governo passou a usá-lo como alojamento de fuzileiros navais. Um ano depois, já ganhou o nome Colônia Penal Cândido Mendes e passou a receber presos que estavam na Colônia de Dois Rios, normalmente presos políticos de Fernando de Noronha, na época base militar para os Estados Unidos.

No ano em que Escadinha nascia, em 1954, o governador Carlos Lacerda formalizava a instituição como um complexo penitenciário considerado de segurança máxima devido sua estrutura prisional e as condições naturais que o envolviam. O local era cercado por mata densa e cerrada, impossibilitando a chegada de veículos por terra.

Quando Escadinha foi parar no Cândido Mendes, o intuito era que ele nunca conseguisse escapar, mas ele arranjou um jeito – e de uma forma espetacular.

A fuga cinematográfica

(Fonte: Mais Goías/Reprodução)(Fonte: Mais Goías/Reprodução)

Na tarde de 31 de dezembro de 1985, enquanto o Brasil e o mundo se preparavam para estourar a champanhe em comemoração ao novo ano que estava prestes a começar, Escadinha se preparava para executar seu plano de fuga orquestrado por José Carlos Gregório, mais conhecido como "Gordo". Durante 3 meses, a cúpula do Comando Vermelho arquitetou como seria feita a fuga do fundador da facção, fazendo conexões e subornando quem fosse necessário para que tivessem êxito.

Chegada a hora, o helicóptero FH1100, sob o controle do Comandante Luiz Pires, que havia sigo alugado por Gordo, foi sequestrado e forçado a pousar em uma clareira a cerca de 1 km do presídio, bem no horário de visitação. Vale ressaltar que a ação de resgate do criminoso foi facilitada pela falta de qualquer proibição de voos para a região.

A fuga só deu certo porque Escadinha prestava serviço na Vila Dois Rios, nas imediações do presídio, cujo perímetro era fortemente vigiado por barcos da polícia. Era comum que os presos recebessem essa espécie de passe dos guardas penitenciários exatamente porque não havia uma forma de eles fugirem, uma vez que as águas eram vigiadas.

Desse modo, Escadinha conseguiu fugir a vista de todos, e nem os policiais ou agentes penitenciários conseguiram atirar na aeronave, tamanha a rapidez que tudo aconteceu. O criminoso foi escoltado por dois carros e transportado de volta ao seu reduto no Morro do Juramento.

O fim

(Fonte: Getty Images)(Fonte: Getty Images)

O Departamento de Investigações Especiais (DIE) organizou uma força-tarefa com 300 homens para caçar Escadinha. Ele passou 3 meses foragido, enquanto pistas da operação de escape foram sendo desvendadas pela polícia por meio de depoimentos e uma investigação minuciosa para pegar as conexões que a facilitaram.

Escadinha só conseguiu ser preso novamente em março de 1986, em um hospital, após levar dois tiros durante um confronto com a polícia militar no Morro do Juramento. Ironicamente, ele foi transportado de volta ao presídio Cândido Mendes por um helicóptero, uma vez que a polícia temia que membros do Comando Vermelho intervissem na transferência.

No ano seguinte, Escadinha foi transferido para o Presídio Frei Caneca, onde tentou uma fuga novamente por helicóptero, mas que fracassou, resultando na morte de dois dos seus comparsas. Com isso, ele finalmente foi parar na penitenciária Lemos de Brito. Em um momento, o criminoso conseguiu o direito a responder em regime semi-aberto, tendo que voltar ao presídio todos os dias para dormir. Em seu horário comercial, Escadinha administrou uma cooperativa de táxi.

Ele manteve essa rotina até 23 de setembro de 2004, quando foi assassinado no carro que conduzia junto ao também detento Luciano da Silva Wanderley, no meio da Avenida Brasil, na altura de Padre Miguel. Aos 48 anos, morria o homem responsável por uma das fugas presidiárias mais espetaculares da história do Brasil, e até hoje a polícia não descobriu quem encomendou a morte de Escadinha e por qual motivo.

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