Artes/cultura
09/06/2024 às 20:00•3 min de leituraAtualizado em 09/06/2024 às 20:00
Na década de 1960, São Paulo vivia uma era de crescimento urbano e social turbulento. Em meio a essa transformação, emergiu uma figura que se tornaria um dos criminosos mais notórios da história brasileira: João Acácio Pereira da Costa, mais conhecido como o "Bandido da Luz Vermelha". Com uma trajetória marcada por assaltos, homicídios e um estilo de vida extravagante, ele deixou uma marca indelével na memória coletiva do país.
João Acácio nasceu em Joinville, em 1942. Desde cedo, sua vida foi marcada pela tragédia. Ficou órfão aos quatro anos e, com seu irmão mais velho, passou a ser criado por um tio abusivo. As adversidades da infância, incluindo trabalhos forçados e torturas, forjaram um jovem rebelde e ressentido. Na pré-adolescência, sofreu abusos de outros meninos, o que parece ter despertado seus piores instintos.
Em sua adolescência, fugiu para São Paulo para escapar das consequências dos pequenos furtos que cometia em Joinville. Foi morar em Santos, onde se apresentava como um jovem de boa família enquanto, na verdade, intensificava suas atividades criminosas. A dualidade entre o "bom moço" e o criminoso astuto se tornaria uma marca registrada de sua personalidade.
Em São Paulo, João Acácio evoluiu de pequenos furtos para uma série de crimes audaciosos. Utilizando diferentes disfarces e técnicas, ele conseguiu despistar a polícia por anos. Sua identidade se fragmentava em quatro figuras distintas: o incendiário, o mascarado, o macaco e o infame "Bandido da Luz Vermelha", apelido que ganhou por usar uma lanterna de aro avermelhado.
Entre 1966 e 1967, Acácio invadiu e roubou cerca de 150 mansões, estuprou mais de cem mulheres e matou entre 10 e 12 pessoas. Seus crimes seguiam um padrão: sempre nas últimas horas da madrugada, ele cortava a energia da casa, usava um lenço para cobrir o rosto e carregava sua característica lanterna vermelha. Sua preferência por mansões e seu estilo único de cometer crimes não só aterrorizavam as vítimas, mas também fascinavam a imprensa, que amplificava sua notoriedade.
A carreira criminosa de João Acácio chegou ao fim em 1967, após deixar suas impressões digitais na janela de uma mansão. Foi preso em Curitiba, vivendo sob a identidade falsa de Roberto da Silva. Em seu interrogatório, confessou quatro assassinatos, sete tentativas de homicídio e 77 assaltos. Sua condenação resultou em uma pena de 351 anos de prisão.
Durante o julgamento, várias teses foram apresentadas para justificar suas ações, incluindo alegações de insanidade, mas todas foram rejeitadas. A polícia nunca conseguiu provar todos os crimes atribuídos a ele, especialmente os estupros, que correram em segredo de Justiça devido às distorções de Acácio sobre as vítimas.
Após cumprir 30 anos de prisão, João Acácio foi libertado em 1997. No entanto, sua liberdade foi curta. Em janeiro de 1998, foi assassinado durante uma briga em um bar em Joinville. Sua vida de crimes deixou um legado complexo e perturbador na história brasileira.
A figura do "Bandido da Luz Vermelha" deixou uma marca indelével na cultura popular brasileira, inspirando diversas obras em diferentes meios. No cinema, sua vida de crimes foi retratada no filme O Bandido da Luz Vermelha de 1968, dirigido por Rogério Sganzerla e estrelado por Paulo Villaça. Embora baseado em eventos reais, o filme alterou o final para que o personagem cometesse suicídio.
Na televisão, ele foi tema do programa Linha Direta Justiça da Rede Globo e satirizado no humorístico Hermes & Renato da MTV. A literatura também contou sua história no livro Famigerado! — A História de Luz Vermelha, o bandido que aterrorizou São Paulo, escrito pelo jornalista Gonçalo Junior em 2019. Na música, sua figura foi homenageada pela banda de rock Ira! na faixa Rubro Zorro do álbum Psicoacústica (1988), que inclui falas do filme de Sganzerla.
A história do “Bandido da Luz Vermelha” serve como um lembrete sombrio das complexidades da natureza humana e da importância de abordar as causas subjacentes da criminalidade. João Acácio foi moldado pelo ambiente em que viveu, e sua trajetória destaca as falhas de uma sociedade em proteger seus cidadãos mais vulneráveis. No entanto, as tragédias que acometeram sua vida não foram capazes de absolvê-lo dos atos violentos que cometeu.