Ciência
22/11/2023 às 02:00•2 min de leitura
Um artigo recente publicado na Smithsonian Magazine acompanha a experiência de uma professora chamada Sarah Kelley que sofreu, desde os 14 anos, com transtornos alimentares. Já na faculdade, ela passou sete meses em um programa de internação para anoréxicos, onde ficou praticamente por dez anos até que, em 2019, teve uma séria recaída, passando a correr obsessivamente, sem se alimentar e murmurando de forma incompreensível.
Na época, seu terapeuta Reid Robison, pesquisador da Universidade de Utah, nos EUA, a convidou para participar de um estudo sobre psicoterapia assistida por cetamina, um anestésico com propriedades psicodélicas, para tratamento residencial de pacientes com transtornos alimentares associados à depressão e ansiedade.
Atualmente com 34 anos, Kelley reconhece: “Cheguei a um ponto em que fiz psicoterapia, fiz tratamento. Eu não sabia mais o que fazer”. Apesar de um alegado medo de usar alucinógenos, mesmo sob supervisão médica, ela aceitou participar.
(Fonte: Getty images)
Usados há séculos, em rituais religiosos de várias culturas, os alucinógenos começaram a ter seu potencial terapêutico explorado no início da década de 1950 pelo psiquiatra Ronald A. Sandison, que pesquisou o uso do LSD no tratamento de transtornos mentais.
Após um hiato de muitos anos, causado principalmente por falta de regulamentação, preconceitos e pressões políticas, o assunto voltou à tona em 2000, quando pesquisadores da Johns Hopkins Medicine, nos EUA, receberam a primeira aprovação regulatória para voltar a pesquisar psicodélicos naquele país.
Mas embora comorbidades como ansiedade, trauma e depressão já sejam tratadas com a psilocibina, a terapia assistida por psicodélicos para transtornos alimentares é um campo ainda novo, que clama por soluções urgentes. Essa grave doença é responsável hoje pela segunda maior taxa de mortalidade entre os transtornos de saúde mental.
(Fonte: Getty Images)
Como participante do estudo de Robison e sua equipe, Kelley recebeu três ciclos de injeções de cetamina, reforçados com sessões de psicoterapia no dia seguinte a cada tratamento. Relaxada em uma poltrona reclinável, ela recebeu a droga em dois intervalos, e conta: “Você simplesmente se sente engraçado — de certa forma dissociativo, deixando seu corpo ou flutuando. Para mim isso foi muito assustador. No início, fiquei em pânico”.
Como o distúrbio alimentar de Kelley surgiu de uma necessidade de controlar o corpo, explica Robison, a cetamina a tirou completamente de si. Depois de ver duas formas escuras, ela as interpretou como seu próprio medo e pânico. Mesmo apavorada, ela percebeu, amparada pelo psicoterapeuta, que aquilo não iria durar para sempre e sobreveio o alívio.
Sentindo que poderia, finalmente, se reconectar com seu corpo, Kelley estava pronta para novos comportamentos de recuperação. “Não creio que a cetamina tenha sido a cura”, afirmou a jovem, mas o tratamento aumentou sua capacidade de interagir com os tratamentos psicológicos que recebia. Ela usou o psicodélico algumas vezes em 2020 e 2021, e continua fazendo psicoterapia.