Artes/cultura
31/07/2021 às 08:00•2 min de leitura
Em 1580, durante uma viagem ao Egito, o botânico italiano Prospero Alpini se deparou com um acervo de plantas incomuns, como bananas de formas estranhas, papoulas de ópio vermelhas e baobás robustos.
Quando voltou para a Europa três anos depois, ele divulgou suas descobertas em dois livros: De Plantis Aegypti e Da Medicina Aegyptiorum. Entre suas ilustrações da flora do Oriente Médio e do Norte da África, estava o cafeeiro.
Alpini descreveu que os árabes e egípcios faziam uma bebida quente da planta, que também era vendida em todos os bares como se fosse uma espécie de vinho. Rapidamente, os médicos começaram uma jornada para tentar descobrir o impacto do café na saúde das pessoas, lutando para entender os efeitos dele e de duas outras bebidas que chegaram juntas em meados do século XVI: o chocolate e o chá.
Claudio Galeno. (Fonte: Wikiwand/Reprodução)
Na Grécia Antiga, os escritores Hipócrates e Claudio Galeno acreditavam que o corpo era composto de quatro tipos de humores (ou fluídos): sangue, catarro, bile negra e bile amarela. Para eles, cada pessoa tinha uma composição humoral única dentro desse sistema pseudomédico, e que o corpo seria acometido por doenças se essas funções se desequilibrassem.
Em O Poder dos Alimentos, um dos textos mais famosos de Galeno, o médico e filósofo classificou os alimentos como a base em seus poderes humorais. Deixando claro que médicos deveriam usar comida para tratar doenças muito antes de recorrer a cirurgias ou cauterizações, ele descreveu várias receitas em seu livro.
(Fonte: Chocolat Class/Reprodução)
“Galeno acreditava que um bom médico também deveria ser um bom cozinheiro”, disse o historiador Mark Grant.
Em vez de medicamentos, os médicos prescreviam alimentos que ajustassem o equilíbrio humoral do paciente adoentado. Quem sofria de febre, por exemplo, deveria ingerir alimentos frios, como saladas e vegetais. Ao menor sinal de indigestão, tomar pimenta e vinho era a saída adequada.
(Fonte: Ricardo Orlandini/Reprodução)
Com o crescimento do comércio ao longo dos séculos XVI e XVII, a demanda por café, chocolate e chá explodiram, desnorteando os médicos da época que tentavam entender o impacto desses alimentos no humor do corpo.
O chocolate era um problema a parte, visto que mudava de forma e qualidade. “Algumas pessoas diziam que o chocolate é gorduroso, portanto quente e úmido”, disse Ken Albala, professor de História na Universidade do Pacífico. “Mas outros médicos diziam que, se você adicionasse açúcar, ficava amargo e adstringente, por isso era indicado para doenças fleumáticas. Como algo poderia ser seco e úmido ou quente e frio ao mesmo tempo?”.
Conforme as bebidas foram se popularizando pela Europa, os conceitos médicos estabelecidos foram cada vez mais questionados, fazendo desmoronar a teoria humoral.
“Mas os médicos persistiram em manter o sistema humoral galênico e resistiram às pessoas que argumentavam contra ele”, disse Mary Lindermann, professora de História da Universidade de Miami.
No entanto, com a entrada do século XIX, os estudos nos campos da fisiologia, anatomia avançada e farmacologia revolucionaram a Medicina de maneira que o sistema humoral não teve mais como se sustentar.