Ciência
24/12/2022 às 10:00•2 min de leitura
Quando vamos à praia ou à piscina, é muito comum dar um mergulho e nadar por alguns instantes por debaixo d'água. Geralmente esta ação dura poucos momentos, já que o ser-humano é capaz de prender a respiração em média por apenas 2 minutos.
Isto, porém, não se aplica aos bajau, um povo que vive ao sul das Filipinas, Indonésia e Malásia, e que evoluiu para conseguir mergulhar por mais tempo. Tradicionalmente nômades, os membros deste grupo vivem basicamente da coleta de crustáceos no fundo do mar — tarefa esta que fazem sem o uso de equipamentos de mergulho modernos.
Ao mergulhar sem utilizar tanques de oxigênio, os bajau dependem única e exclusivamente do próprio fôlego. A necessidade de passar tanto tempo debaixo d'água em busca do próprio sustento teria sido responsável pela evolução de um importante órgão do corpo: o baço.
Acontece que cientistas descobriram que este órgão dos membros da tribo nômade (que segundo estimativas aproximadas hoje totalizam cerca de 1 milhão de pessoas) pareciam maior do que o habitual. Quando comparados a outros povos, cujo estilo de vida envolve por exemplo atividades agrícolas, um estudo revelou que o baço dos bajau era em média 50% maior em relação aos dos membros de grupos vizinhos.
Povo asiático é nômade e vive basicamente da coleta de crustáceos
E isto faz bastante sentido: embora pequeno, o baço é o órgão responsável por filtrar o sangue, removendo as células velhas. Ter o baço maior seria portanto uma grande vantagem, já que ele conseguiria filtrar uma quantidade maior de sangue, consequentemente permitindo segurar o fôlego e mergulhar por mais tempo.
Segundo Melissa Ilardo, que liderou o estudo pela Universidade de Copenhague, da Dinamarca, a resposta para tal evolução estaria justamente nos hábitos da tribo asiática. "Por possivelmente milhares de anos, eles vivem em barcos-casa, viajando de um lugar para outro nas águas do Sudeste Asiático e parando em terra firme só de vez em quando. Então, tudo o que precisam, eles obtêm do mar," explicou a pesquisadora em entrevista à BBC.
Ainda de acordo com Ilardo, os bajau chegam a mergulhar repetidamente a profundidades de mais de 70 metros por mais ou menos oito horas por dia, passando cerca de 60% do tempo debaixo d'água em diversos mergulhos que podem durar entre 30 segundos e "vários minutos".
Ilardo explica haver uma "resposta humana ao mergulho que é acionada quando você prende a respiração e fica submerso na água," sendo possível acionar tal mecanismo até mesmo simplesmente afundando o rosto em água fria. Quando ativado, nossa frequência cardíaca diminui, causando "vasoconstrição periférica, em que os vasos sanguíneos em suas extremidades ficam menores para preservar o sangue oxigenado de seus órgãos vitais e, então, a última coisa que acontece é uma contração do baço."
Os bajau mergulham cerca de oito horas por dia e podem ficar vários minutos debaixo d'água
E é daí que viria a evolução do órgão dos bajau. Como os mergulhos profundos são realizados sem aparatos modernos, usando apenas um cinto de peso para ajudar o mergulhador a afundar e máscaras de madeira ou óculos de proteção, o baço faz basicamente o papel de "tanque de mergulho biológico." De acordo com Ilardo, "o baço é um reservatório de glóbulos vermelhos oxigenados e que, por isso, quando é contraído, dá à pessoa um reforço de oxigênio".
Um fato curioso é que o órgão não é maior apenas nos mergulhadores da tribo, mas sim uma característica comum a todo o povo — reforçando que o crescimento do baço não era uma consequência do hábito de indivíduo de mergulhar, mas sim uma potencial característica evolutiva.