Ciência
27/12/2022 às 12:00•2 min de leitura
Apesar de a medicina moderna ter evoluído consideravelmente em questões tecnológicas, fazendo com que os seres humanos aumentassem suas expectativas de vida, nem sempre tudo foi assim. Durante a maior parte da história, procedimentos cirúrgicos eram extremamente sangrentos, dolorosos e perigosos.
Sem o benefício de contar com antissépticos e anestesias, os médicos precisavam correr contra o tempo para tomar as melhores decisões — o que era bastante arriscado. No início do século XX, no entanto, a maioria dos avanços científicos começaram a surgir e a medicina foi tomada por uma prática temerosa: tomados por novas ideias, médicos passaram a remover órgãos humanos perfeitamente saudáveis em uma busca incessante para livrar a humanidade de doenças. Entenda!
Ilya Metchnikoff. (Fonte: Wikimedia Commons)
A chamada excisão preventiva de órgãos perfeitamente saudáveis surgiu como uma técnica para tentar livrar as pessoas de ficarem constipadas. Em 1914, o biólogo russo Ilya Metchnikoff, ganhador do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 1908 por seu trabalho pioneiro em imunologia, desenvolveu uma teoria da doença crônica que chamou de "autointoxicação".
Essa teoria dizia que o cólon, a parte do intestino grosso que conecta o intestino delgado ao reto, estagnava e apodrecia. Na visão de Metchikoff, inclusive, o apodrecimento dessa parte do corpo também era responsável por causar úlceras, câncer de bexiga, hipertensão, artrite reumatóide e até distúrbios psiquiátricos.
Com base nisso, o médico William Arbuthnot Lane, do Reino Unido, teve a ideia de começar a praticar um tipo de procedimento que lhe tornaria infame dentro da comunidade médica: a colectomia radical, na qual o cólon é extirpado e a extremidade do intestino delgado ligada diretamente ao reto. Da década de 1910 até a de 1930, milhares de britânicos e americanos tiveram seus dois pontos perfeitamente saudáveis cortados como medida preventiva.
Ilustração de uma boca com dentes faltando de um livro de Henry Cotton, de 1921. (Fonte: Princeton University Press/Wikimedia Commons)
As colectomias tornaram-se tão populares que o procedimento passou a ser prescrito regularmente para doenças menores como dor de garganta ou úlcera estomacal. Porém, os resultados nunca foram verdadeiramente satisfatórios. A maioria dos pacientes de Lane não tiveram nenhum benefício com a prática, o que fez com que o médico abandonasse sua crença nesse tipo de cirurgia radical.
Contudo, ele não foi o único ao longo dos anos com esse tipo de intervenção cirúrgica em mente. Em 1907, por exemplo, Henry Andrews Cotton, superintendente do New Jersey State Lunatic Asylum (EUA), soube de uma nova teoria que falava sobre como infecções ocultas poderiam corroer a mente humana e aumentar os riscos de problemas psiquiátricos.
Portanto, para Cotton, bastava eliminar o local da infecção e a doença mental seria curada. Ele estava tão obcecado com esse pensamento que chegou a arrancar os dentes de seus próprios filhos como forma de precaução. Além disso, muitos de seus pacientes perderam testículos, ovários, baços, estômagos, vesículas biliares, colo do útero e, claro, cólon.
Apesar de as evidências de sucesso nunca terem sido claras e os resultados serem duvidosos, esse tipo de procedimento era considerado progressista naquela época e abriu precedentes para algumas cirurgias modernas. Foi por meio desses "testes" que descobrimos alguns locais de infecção crônica no corpo humano e, por isso, realizamos cirurgias de extração de amígdalas e apêndice até hoje.