Ciência
29/12/2024 às 15:00•3 min de leituraAtualizado em 29/12/2024 às 15:00
É provável que você já tenha notado, mas é comum que as pessoas tenham reações diferentes no seu corpo quando ingerem o mesmo alimento. Alguns podem digerir super bem algum tipo de comida, enquanto em outra pessoa ela causa mal-estar.
Agora uma novo estudo traz novas informações sobre como as bactérias do intestino influenciam nesse aspecto. Isso tem a ver com os tipos de micro-organismos que temos dentro de nós e com a trajetória percorrida em nosso trato digestivo.
O experimento, elaborado em 2021, era no mínimo curioso: cinquenta voluntários precisavam engolir uma cápsula um pouco menor que um polegar enquanto tomavam o seu café da manhã. A cápsula então atravessava o estômago, intestino delgado e intestino grosso, órgãos em que coletava informações sobre pH, temperatura e pressão.
Em cerca de 12 a 72 horas, a cápsula era excretada nas fezes. Até aí, os pesquisadores já haviam observado que tanto o ambiente intestinal quanto o tempo de viagem pelo intestino variavam de pessoa para pessoa.
"Podemos ver, por exemplo, que levou 2 horas para a cápsula passar pelo intestino delgado em algumas pessoas e 10 horas em outras", afirmou Henrik Roager, pesquisador e professor do departamento de nutrição, exercícios e esportes da Universidade de Copenhague, que foi o líder do estudo.
"Como já sabemos que absorvemos a maioria dos nossos nutrientes no intestino delgado, as diferenças no tempo de viagem no intestino delgado provavelmente têm um impacto na quantidade de nutrientes que absorvemos e na quantidade que passa para o intestino grosso, onde as bactérias intestinais entram em ação", acrescentou Roager.
Assim, o experimento inovou pelos dados que puderam ser coletados. Antes disso, a atividade no intestino costumava ser examinada por meio de amostras de fezes, que eram comparadas ao que a pessoa havia comido. A cápsula, de outro modo, trazia uma visão mais precisa de como o ambiente muda por todo o intestino.
“A cápsula significa que podemos coletar informações que podem ajudar a explicar diferenças individuais na digestão, absorção de nutrientes e padrões de movimento intestinal. Isso nos fornece um conhecimento muito maior do que conseguimos obter anteriormente por meio de padrões alimentares e amostras de fezes”, informou o pesquisador.
As descobertas feitas pelo estudo foram surpreendentes. Constatou-se que, na primeira etapa do sistema digestivo, a cápsula e o alimento chegavam primeiro ao estômago, onde registravam um valor de pH muito baixo. Isso acontece porque, no estômago, é liberado um ácido que decompõe o alimento.
Em seguida, o alimento e a cápsula se moviam para o intestino delgado. Nesse órgão, as células intestinais liberam o bicarbonato alcalino, que neutraliza o ácido estomacal, e é também onde os nutrientes são absorvidos. O restante indigesto do alimento e a cápsula segue para o intestino grosso, onde o alimento é fermentado pelas bactérias intestinais.
Neste local, as bactérias intestinais começam a produzir ácidos graxos, que fazem com que o valor do pH caia novamente na primeira parte do cólon. No entanto, o valor do pH começa a aumentar ao longo do comprimento do intestino grosso, assim que os ácidos graxos são absorvidos pela parede do intestino.
Isso faz com que a atividade das bactérias intestinais mude, assim como o pH. "Sabemos que o pH é um fator crucial no crescimento e atividade bacteriana, então fez todo o sentido que pudéssemos ver que o ambiente intestinal e o pH estão ligados a diferenças na composição e atividade das bactérias intestinais. Isso significa que as condições ambientais que cada um de nós tem em nosso intestino podem ajudar a explicar por que temos bactérias diferentes no intestino", pontuou Roager.
De acordo com o pesquisador, a ideia é que essas constatações sejam úteis para se pensar em aspectos referentes à nutrição. “Nossos resultados mostram que somos todos únicos — também em nosso intestino. Estamos acostumados a presumir que todos digerimos e absorvemos alimentos da mesma forma e na mesma extensão, mas também podemos ver que nem sempre é esse o caso. Nosso estudo fornece mais evidências de que os indivíduos reagem de forma diferente aos alimentos — e aqui as diferenças em nosso ambiente intestinal podem muito bem desempenhar um papel importante", concluiu.