Artes/cultura
27/03/2024 às 09:00•2 min de leituraAtualizado em 27/03/2024 às 09:00
Você sabia que o gelo da Antártica pode revelar como muitos acontecimentos do passado se desdobraram? Assim como diversas superfícies, o tempo as molda e, ao mesmo tempo, contribui com que depósitos de materiais variados se acumulem gradativamente.
Mas a Antártica apresenta um fator que contribui bastante para que suas porções continentais forneçam registros tão ricos do passado terrestre: o continente não foi povoado e, além disso, o gelo mantém as evidências intactas.
Para se ter uma ideia do quão longe diversas análises podem ir, a partir da coleta de gelo de áreas mais profundas, pesquisadores conseguem saber não só como era o clima de uma determinada época, mas também visualizar como evoluiu a emissão de poluentes pelo homem a partir da revolução industrial, marco histórico que representa o início da ação antropogênica sobre o clima.
Ou seja, esses estudos, conjuntamente, fornecem informações que suprem lacunas, além de complementar dados de medições antes que as médias de temperaturas fossem registradas. As bolsas de ar comprimidas no gelo são consideradas valiosas justamente por isso. Com elas, até mesmo o impacto de erupções vulcânicas pode ser estimado.
Em relação ao processo de colonização das Américas, ocorrido a partir das Grandes Navegações, não é diferente: em menos de 150 anos da chegada dos europeus, estima-se que 56 milhões de indígenas que habitavam o continente morreram. E as amostras de gelo, por sua vez, fornecem evidências das mudanças na atmosfera ocorridas nesse período.
O estudo que se aprofundou nessa descoberta, em particular, fornece um dado novo envolvendo a colonização da América. O contato entre os europeus e os povos nativos, além dos conflitos diretos, fez com que uma série de doenças se espalhasse entre os indígenas, como o sarampo, a varíola e a gripe, aniquilando-os uma vez que não tinham desenvolvido imunidade.
Mas neste caso, essa morte foi registrada de uma forma atípica: com o declínio populacional, as áreas de florestas destruídas pelas ocupações indígenas voltaram a crescer, afinal, elas foram abandonadas em larga escala. Assim, mais gás carbônico era absorvido pela vegetação que nascia, e menos poluentes pairavam sobre a atmosfera. Essa mudança é justamente a que foi registrada nesse período em amostras de gelo da Antártica.
O artigo, publicado na revista Nature Communications, aponta que essa redução de poluentes se deu de forma súbita por volta de 1610, conforme indicam amostras do núcleo de gelo de Skytrain Ice Rise, localizado na Antártica Ocidental. A redução de gás carbônico foi de 8,0 ppm ao longo de 157 anos, sendo 0,5 ppm por década.
O degelo dessas porções isoladas, por outro lado, representa não só o risco de perda de todas essas evidências, mas também o perigo que espécies de vírus, outrora inativos, se propaguem. A Sibéria é outro local em que se concentram muitas destas preocupações, servindo de alerta que, infelizmente, se nada for feito para reverter as mudanças climáticas, seus efeitos e consequências serão notados por todos.