Artes/cultura
30/09/2023 às 09:00•2 min de leitura
Talvez você ainda não tenha notado, mas o céu noturno está se tornando cada vez mais brilhante e menos escuro. O fenômeno tem várias explicações, como o aumento do número de satélites circulando no espaço e a poluição luminosa provocada por tantos domicílios e edifícios com luz elétrica.
Mas o que os cientistas agora estão descobrindo é que essa falta de escuridão pode estar afetando a saúde humana e ecológica. A razão é bem lógica: o excesso de luz mexe com os ciclos circadianos e com o comportamento de vários animais, como as aves que costumam migrar de um lugar ao outro.
Contudo, os impactos vão além da biologia: a ausência do céu escuro também pode estar afetando nosso hábitos culturais.
(Fonte: Getty Images)
Para explicar esse sentimento, a professora Aparna Venkatesan, da Universidade de São Francisco, e John C. Barentine, da Dark Sky Consulting, desenvolveram um termo interessante: "noctalgia". Ele se refere à perda das sensações provocadas pelos céus escuros.
“Oferecemos aqui o termo noctalgia para expressar 'luto celeste' pela perda acelerada do ambiente doméstico de nossos céus compartilhados, um desaparecimento sentido globalmente e que merece seu próprio campo de estudo: 'nictologia'”, escreveram os autores em uma carta enviada à revista Science.
Segundo os pesquisadores, há muitas perdas associadas a esta sensação, como a de tradições celestes milenares, os encontros ao pé de uma fogueira, bem como elementos presentes na linguagem e a capacidade de compartilhar certas histórias. A noctalgia também estaria associada a fatores de estresse que afetam as populações mundialmente através de uma sensação de esgotamento.
(Fonte: Getty Images)
Obviamente, a noctalgia não é um estado de perturbação mental diagnosticado que pode ser tratado. Para se "livrar" dessa sensação de perda dos céus noturnos, há soluções relativamente simples, mas que envolvem esforços políticos. É preciso reduzir a quantidade de poluição luminosa, diminuindo a emissão de tantas luzes nas cidades.
Uma questão mais complexa é a exploração do espaço. Hoje vivemos em uma época em que empresas como a SpaceX, de Elon Musk, estão explorando intensamente o espaço com o disparo de muitos satélites. Eles podem trazer vários problemas, como afetar as observações astronômicas do espaço profundo quando cruzam o campo de visão de um telescópio; mas, além disso, os satélites espalham e refletem a luz solar por meio de seus painéis solares.
Ainda que a exploração de satélites esteja sendo feito de forma legal, um dos resultados é um aumento estrondoso da quantidade de luz artificial no horizonte. Alguns estudiosos estimam que, em certas regiões do mundo, o céu está cerca de 10% mais brilhante do que era há apenas meio século.
Venkatesan e Barentine ainda colocam mais sugestões sobre o que pode ser feito para diminuir a noctalgia. “Alguns dos próximos passos poderiam ser: expandir essas proteções e políticas nacionais e internacionais coordenadas globalmente para os céus; designação dos céus como patrimônio cultural imaterial pelas Nações Unidas; e, expandindo a linguagem/proteções associadas à jurisprudência da Terra e aos 'Direitos da Natureza'”, escreveram na carta à Nature.