Estilo de vida
19/12/2024 às 00:00•3 min de leituraAtualizado em 19/12/2024 às 00:00
Em abril de 2007, o deputado João Pedro propôs um projeto de lei que vetava o uso de celulares e outros dispositivos eletrônicos em escolas públicas estaduais durante os horários de aula. Em sala, os professores eram instruídos a confiscarem os aparelhos dos alunos que insistissem em usá-los e os devolvessem apenas no final da aula.
A intenção do deputado era acabar com a fofoca e o trânsito de mensagens SMS durante as aulas, o que, segundo ele, atrapalha o aprendizado e dispersa a atenção do professor e dos alunos. Na época, João Pedro declarou que conversou com alguns professores e se surpreendeu com as inúmeras queixas em relação ao uso do celular pelos alunos.
Sob o lema de que “Escola é lugar para estudar”, João Pedro conseguiu fazer com que seu projeto de lei fosse aprovado pelo Executivo e transformado na Lei 12.730, de outubro de 2007. Dez anos depois, a ALESP (Assembleia Legislativa de São Paulo) aprovou o projeto que alterou a lei 12.730/2007, esclarecendo que crianças e jovens dos ensinos Fundamental e Médio poderiam utilizar aparelhos em sala de aula em atividades pedagógicas e orientadas por educadores.
Agora, a proposta da deputada estadual Marina Helou (Rede) sobre proibir o uso de celulares nas escolas foi sancionada pelo governador de São Paulo, Tarcísio Freitas. Seu texto proíbe o uso de celulares e quaisquer dispositivos eletrônicos que possuam acesso à internet, de tablets a relógios inteligentes, durante todo o período de permanência do aluno na escola. Ou seja, as instituições deverão confiscar os aparelhos assim que os alunos chegam à instituição e devolvê-los apenas no final do período.
Com essa decisão, São Paulo se tornará o primeiro estado a adotar uma proibição de celulares nas escolas para além do horário de cada aula, se juntando a outros estados e países pelo mundo que já baniram os aparelhos do ambiente educativo. Mais de 60 países proíbem celulares nas salas de aula por lei ou política, como o Chile, Finlândia, Hungria, Coreia do Sul, Nova Zelândia, Canadá e Rússia, segundo o Relatório GEM (Global Education Monitoring) da UNESCO. Há também restrições parciais ou totais na Bulgária, Grécia, Portugal e Suíça. É crescente também a adoção da restrição em alguns locais dos Estados Unidos.
A decisão é uma resposta à crescente preocupação sobre o bem-estar acadêmico, socioemocional e mental dos alunos, além de eliminar essa fonte de distração que piora a saúde mental dos adolescentes e eleva os níveis de estresse e ansiedade.
Em 2023, durante uma conversa na Casa Branca sobre saúde mental juvenil, o cirurgião-geral Vivek Murthy disse que crianças menores de 14 anos não devem usar mídias sociais e chegou a emitir um aviso de saúde pública destacando os possíveis danos das mídias sociais à saúde mental dos jovens.
"O ambiente distorcido das mídias sociais muitas vezes presta um desserviço a maioria dessas crianças.", disse o médico.
Apesar disso, o uso de mídia social entre crianças de 8 a 18 anos aumentou 17% entre 2019 e 2021, segundo um relatório da Common Sense Media, de 2022. O uso frequente e precoce desses meios de comunicação tornam as crianças e jovens excessivamente sensíveis à antecipação de riscos sociais e recompensas dos colegas, piorando sua convivência em um dos primeiros meios sociais que a escola é.
As taxas de ansiedade e depressão estão aumentando desde meados da década de 1990, mas os celulares e as mídias sociais comprovadamente aceleraram ou exacerbaram o problema. Em uma revisão sistemática de 50 artigos de pesquisa, em 2023, publicados na revista BMC Psychology, pesquisadores comprovaram que o tempo de tela dos adolescentes está associado a problemas em seu bem-estar e que as redes aumentaram o risco de depressão em meninas.
À Education Week, a diretora do Centro de Alfabetização Midiática e Informacional da Temple University, Sherri Hope Culver, disse que é inútil e praticamente impossível manter os jovens longe das redes sociais em um mundo totalmente digital. O que os pais e, principalmente, líderes educacionais devem fazer é ter uma conversa mais eficaz e valiosa sobre como ajudar esses jovens a terem um relacionamento saudável com os meios digitais.
Essa é a famosa "alfabetização midiática", definida como a capacidade de acessar, analisar, avaliar, criar e agir usando todas as formas de comunicação, segundo a National Association for Media LIteracy Education.
Culver está no rol dos defensores que alegam que a alfabetização midiática deve ser ensinada a todos os alunos desde o jardim de infância, uma vez que quase todas as informações que as crianças obtêm vêm de uma fonte de mídia. Para ela, é só alterando o status quo que a proibição dos celulares na escola terá efeito.