O método vitoriano de comunicação por anúncios codificados nos jornais

18/09/2022 às 05:002 min de leitura

Entre 1850 e 1855, o jornal britânico The Times publicou uma série de anúncios codificados que chamaram a atenção dos leitores. Sem legibilidade ou endereçamento claro, as mensagens eram destinadas a alguém em específico e ocorriam sempre no início de cada mês. Curiosamente, a estratégia não vingou e apenas poucos enigmas foram compartilhados no período — mas será que alguém chegou a desvendar seus segredos?

Segundo a criptóloga Elonka Dunin para a Vice, parte desses anúncios foi destinada a um explorador conhecido como Richard Collinson, encarregado de descobrir como acabou a viagem dos navios desaparecidos de Sir John Franklin, HMS Terror e HMS Erebus, em uma expedição ao Ártico.

Na época, o viajante possuía 39 anos e capitaneou o HMS Enterprise, mas sofreu com dificuldades de comunicação com o povo inuíte logo após encontrar fortes evidências de Franklin na Ilha King William.

(Fonte: Wikimedia Commons)(Fonte: Wikimedia Commons)

Ao todo, a missão de busca durou cinco anos problemáticos, com o líder encarregado do projeto enfrentando desavenças com tripulantes, mapas já cobertos e sem grandes respostas e pesquisas de navegação pouco conclusivas. Além disso, Collinson não recebia notícias de sua família e sustentou essa ausência em condições remotas de localização. Porém, de acordo com seu irmão Thomas Bernard, falta de tentativa não houve.

Sinais em mensagens criptografadas

Seis anos após a morte de Richard, Thomas Bernard Collinson publicou o Journal of HMS Enterprise, uma espécie de relato de todas as aventuras conhecidas vivenciadas pelo navio de seu irmão. Um dos detalhes chamou a atenção dos leitores e evidenciou o conhecimento do falecido navegante em linguagem criptografada: o livro de sinais da Marinha Real.

De acordo com o autor do projeto, Richard criou uma forma de comunicação trocando letras por números e utilizava esse sistema para conversar com a família em condições adversas. A técnica, também conhecida pelo irmão do explorador, serviu como base para o envio de publicações enigmáticas no jornal mais popular da época.

Mesmo assim, elas infelizmente não chegaram a ser reparadas pelo destinatário, devido ao Ártico estar fora do alcance de cobertura da entrega. Porém, quando desembarcou em Banyuwangi, na Indonésia, ele viu os anúncios.

(Fonte: Wikimedia Commons)(Fonte: Wikimedia Commons)

O código só foi decifrado oficialmente em 1947, quando um estudioso da expedição descobriu informações confidenciais após trocar os signos contidos nas cartas. Os conteúdos traziam detalhes sobre nascimentos, mortes, casamentos.

No entanto, a ausência de informações relevantes para o departamento de pesquisa fez com que o projeto de decodificação fosse esquecido. Apenas em 1992 foram alcançadas mais conclusões sobre a técnica enigmática.

O "berço" e outros usos

As chaves cruciais foram chamadas de “berços” pelos criptólogos e davam pistas sobre seus conceitos a partir de um texto simples cifrado. Essa técnica possibilita uma espécie de progressão por eliminação, onde as possibilidades são reduzidas a partir da identificação de traços padrão da língua, como a união de letras em um conjunto de palavras. “Um determinado número de três dígitos pode significar quatro coisas diferentes, então você precisa usar algum contexto enquanto tenta descobrir o que ele diz”, diz Dunin.

(Fonte: The Times/newspapers.com/Reprodução)(Fonte: The Times/newspapers.com/Reprodução)

Segundo a estudiosa, outros grupos usaram esse sistema para se comunicar por meio de jornais. Além de exploradores, amantes vitorianos — nação altamente preocupada com sua privacidade — reduziam espaço de anúncios e economizavam dinheiro para mandar mensagens criptografadas e curtas. Casais e pessoas apaixonadas aproveitavam o espaço em tabloides para serem românticos, utilizando pseudônimos a fim de ter a intimidade preservada.

Curiosamente, quase todas essas histórias não tiveram suas conclusões compartilhadas, já que nada era divulgado sobre a recepção das mensagens ou, até mesmo, sua compreensão. Apesar disso, as comunicações secretas por meio de jornais eram uma importante estratégia de movimentação local, visto que atraía as pessoas mais curiosas a fim de descobrirem o teor dos textos e dinamizava relações de todo o tipo, tornando as coisas mais interessantes.

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